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Da 'aula de crime' à cadeia: como funcionava o 'clube do bilhão'

Assalto aos cofres da Petrobras era tramado como acordo entre compadres. Transações complexas garantiram impunidade a corruptores por uma década

 
Na denúncia apresentada nesta quinta-feira contra parte dos envolvidos na “aula de crime”, como descreveu o procurador-geral da República, desvendada pela Operação Lava Jato da Polícia Federal, o Ministério Público detalha a engrenagem do “clube do bilhão” – o cartel formado por grandes empreiteiras do país para partilhar contratos públicos. E o que se nota é que o assalto aos cofres da Petrobras era tramado como um acordo entre compadres. Executivos da Camargo Corrêa, Galvão Engenharia, Engevix, OAS, UTC e Mendes Júnior reuniam-se para combinar lances em licitações e, para garantir contratos fraudulentos, distribuíam propina a funcionários públicos, como o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa.
Transações complexas garantiram impunidade aos corruptores por mais de uma década, até que fossem descobertos os clientes do doleiro Alberto Youssef, preso em março deste ano e apontado como pivô do esquema descoberto pela Lava Jato. Três dias depois foi detido Paulo Roberto Costa. Após firmarem acordos de delação premiada, a dupla deixou aos investigadores um rastro de documentos com registros de negociatas, comprovadas por meio da quebra dos sigilos fiscais e bancários dos dois. Assim que foram descobertos pagamentos suspeitos de fornecedores da Petrobras, começava a ruína do “clube do bilhão”.
As denúncias apresentadas até agora tratam apenas dos recursos desviados da Diretoria de Abastecimento entre 2004 e 2012. Sob a batuta de Costa, foram desviados cerca de 287 milhões de reais no período para os bolsos do ex-diretor e da quadrilha do doleiro Youssef. É uma estimativa conservadora, porque de 1% a 5% do valor de cada contrato era desviado, de acordo com as investigações. O dinheiro saía de contratos superfaturados ou desnecessários firmados pela estatal com as seis empreiteiras. A seguir, entenda a atuação de cada uma no esquema:
Galvão Engenharia
Foi a empresa com o maior número de contratos beneficiados pelo esquema de corrupção. O Ministério Público Federal elencou desvios em obras da Refinaria de Abreu e Lima, do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), da refinaria Premium I, da Refinaria Landulpho Alves, da Refinaria de Paulínia e dos terminais de Angra dos Reis, Ilha D´Água e Ilha Redonda. As negociatas renderam 46 milhões de reais, o equivalente a 1% do valor dos contratos fechados com a estatal, na cota da propina que cabia ao ex-diretor Paulo Roberto Costa. O dinheiro foi desviado para empresas de fachada do doleiro Alberto Youssef. Foram denunciados à Justiça os sócios Eduardo de Queiroz Galvão e Dário de Queiroz Galvão Filho, assim como os executivos Erton Medeiros Fonseca, que está preso preventivamente, e Jean Alberto Luscher Castro.
OAS
É a empresa com mais executivos denunciados. Foram acusados Fernando Augusto Stremel Andrade, João Alberto Lazzari, Agenor Franklin Magalhães Medeiros, José Aldemário Pinheiro Filho, José Ricardo Nogueira Breghirolli e Mateus Coutinho de Sá Oliveira. Os quatro últimos estão presos. Os procuradores da República identificaram desvio de recursos em obras e serviços da OAS nas refinarias Getúlio Vargas, no Paraná, e Abreu e Lima, em Pernambuco. Pelo menos 29,3 milhões de reais foram desviados sob a ingerência de Paulo Roberto Costa, por empresas do doleiro.
Camargo Corrêa
Primeira empreiteira a entrar no foco dos investigadores, a Camargo Corrêa desviou recursos e pagou propina por contratos para serviços nas refinarias Getúlio Vargas, no Paraná, e Abreu e Lima, em Pernambuco. Três executivos foram denunciados e já estão presos: João Ricardo Auler, Dalton dos Santos Avancini e Eduardo Hermelino Leite. Pelo menos 73 milhões de reais foram desviados para a cota de Paulo Roberto Costa. Ao contrário da maioria dos concorrentes, o dinheiro não saia por empresas de fachada. A Camargo Corrêa contratava a Sanko Sider e a Sanko Serviços para serviços superfaturados ou inexistentes e as duas empresas faziam transferências ou providenciavam saques em espécie para o doleiro e os beneficiários.
Mendes Júnior
Foram denunciados dois sócios, dois executivos e um representante. Apenas Sérgio Cunha Mendes está preso preventivamente. Os outros acusados foram Ângelo Alves Mendes, José Humberto Cruvinel Resende, Rogério Cunha de Oliveira e Alberto Elísio Vilaça Gomes. Houve favorecimento para a Mendes Júnior em obras nas refinarias de Paulina, em São Paulo, Gabriel Passos, em Minas Gerais, Getúlio Vargas, no Paraná, e no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro. Também houve facilidades em obras nos terminais aquaviários de Barra do Riacho, Ilha Comprida e Ilha Redonda. O duto rendeu pelo menos 71,6 milhões de reais na fatia do esquema retirada na cota de Paulo Roberto Costa, distribuídos por empresas de fachada controladas pelo doleiro.
Engevix
Dois executivos, um sócio e um ex-funcionário denunciados. Apenas o sócio Gerson de Mello Almada está preso. Chegaram a ficar presos Newton Prado Júnior e Carlos Eduardo Strauch Alberto, também denunciados com o ex-funcionário Luiz Roberto Pereira. A Engevix foi beneficiada em contratos nas refinarias Getúlio Vargas, no Paraná, Abreu e Lima, em Pernambuco, Landulpho Alves, na Bahia, Gabriel Passos, em Minas Gerais, Paulínia, em São Paulo, e Presidente Bernardes, também em São Paulo. Isso rendeu pelo menos 53 milhões de reais desviados para a cota de Paulo Roberto Costa, repassados por empresas de fachada do doleiro Youssef.
UTC
Foram denunciados o sócio-presidente Ricardo Ribeiro Pessoa e os executivos João Teive Argollo e Sandra Raphael Guimarães. Pessoa, preso na carceragem da Polícia Federal, foi apontado nas investigações como o coordenador do cartel de empreiteiras. Era ele quem convocava o grupo para participar de reuniões na sede da UTC. A empresa teve 12,7 milhões de reais desviados para a cota de Paulo Roberto Costa de uma obra do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj). Assim como no caso do grupo Camargo Corrêa, os recursos também foram desviados pela Sanko Sider, contratada pela UTC para prestar serviços superfaturados ou inexistentes, que depois repassava recursos para empresas de fachada. Mas Pessoa e os dois funcionários foram ainda acusados de ajudar o doleiro Alberto Youssef a esconder a origem ilícita de um terreno em Lauro de Freitas, na Bahia, adquirido em sociedade pela UTC e pelo doleiro e registrado apenas no nome da empreiteira.

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