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Comissão da Verdade ressuscita debate por flexibilização da Lei de Anistia

Nova tentativa de punição a agentes da ditadura tenta ressuscitar discussão já encerrada pelo Supremo. Dilma não deu sinais de que encampará o esforço

 
A presidente Dilma Rousseff chora durante discurso em cerimônia da Comissão Nacional da Verdade, em Brasília, nesta quarta-feira (10/12), em que recebeu o relatório sobre os crimes cometidos na ditadura milita
A presidente Dilma Rousseff chora durante discurso em cerimônia da Comissão Nacional da Verdade, em Brasília, nesta quarta-feira (10/12), em que recebeu o relatório sobre os crimes cometidos na ditadura milita (AFP)
O fim dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV) não significa o encerramento do debate sobre a punição a agentes que cometeram crimes durante a ditadura. Pelo contrário: com o relatório final concluído, deve aumentar a pressão para que a interpretação da Lei da Anistia seja revista, de modo a permitir a punição a figuras ligadas ao regime militar.
A CNV começou a funcionar em 2012 com o objetivo declarado de investigar violações dos direitos humanos durante o regime militar e, ao mesmo tempo, promover a reconciliação nacional. No momento em que a comissão encerra seus trabalhos, entretanto, o segundo objetivo parece ter sido deixado em segundo plano. Do início ao fim, o relatório apresentado nesta quarta omite crimes cometidos por grupos radicais de esquerda e trata como meras organizações políticas alguns grupos que, na verdade, eram organizações armadas que defendiam um regime tão ou mais autoritário quanto o que estava no poder.
O apelo em favor da punição a agentes públicos da época, a despeito da Lei da Anistia, tampouco colabora com a pacificação dos ânimos. A sugestão é feita pelo próprio relatório da CNV, sob o argumento de que crimes contra a humanidade são imprescritíveis. O ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, que integrou o grupo, afirmou nesta quarta-feira que é preciso reinterpretar a lei: "Não me parece que nós temos que fazer revisão da Lei da Anistia, mas proclamar que a anistia não se estende aos agentes do Estado que praticaram excessos e violência contra os que se apuseram", disse ele.
Já há quem esteja disposto a patrocinar a causa: o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinícius Furtado, prometeu nesta quarta-feira empenho para "perseguir a responsabilização dos agentes do Estado que perpetraram crimes de lesa-humanidade”. Ex-ministro da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi endossou a tese.
A nova tentativa de punição a agentes da ditadura tenta ressuscitar uma discussão já encerrada pelo Supremo Tribunal Federal. Em abril de 2010, por 7 votos a 2, a corte manteve a anistia completa a representantes dos dois lados envolvidos no conflito da época. Mas os insatisfeitos com a decisão pretendem usar outro fato para retomar o pedido ao STF: em dezembro do mesmo ano, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil por não ter punido os responsáveis por abusos durante a ditadura.
A composição do STF se alterou significativamente desde então. Dos ministros que votaram na época, quatro permanecem na corte. Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia se opuseram à punição aos militares, enquanto Ricardo Lewandowski, atual presidente, defendeu a flexibilização da Lei da Anistia. A nova composição da corte, entretanto, não permite uma previsão clara sobre o resultado de um novo julgamento sobre o tema.
Ao mesmo tempo em que exalta aqueles que, com ou sem armas, lutaram contra o regime militar, o governo não parece disposto a encampar o esforço pela punição retroativa. É o que a presidente Dilma Rousseff deu a entender no discurso que fez após receber o relatório da CNV, nesta quarta. "Nós jamais poderemos deixar de enaltecer esses lutadores e lutadoras, mas também reconhecemos e valorizamos os pactos políticos que nos levaram à redemocratização", disse ela.

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