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Drogas e Irã pautam diplomacia de Romney para América Latina


Na plataforma do republicano, a região aparece como fonte de regimes autoritários e imigrantes ilegais

SHINGTON - Em outras narrativas, a América Latina aparece como um continente de economias emergentes, pacífico e em processo de consolidação democrática. Mas na plataforma do agora oficial candidato do Partido Republicano à Casa Branca, Mitt Romney, a América Latina é primordialmente uma fonte de "regimes autoritários" antiamericanos e imigrantes ilegais, bem como campo fértil para grupos "terroristas" e gangues de tráfico de drogas.

Romney ao lado da mulher em campanha nos EUA - J. Scott Applewhite/AP
 
Romney ao lado da mulher em campanha nos EUA
Estas são palavras-chave que dão cores ao texto cujo resumo está postado no próprio site da campanha de Mitt Romney. Uma versão mais aprofundada do plano de governo que está sendo discutido na convenção do partido na Flórida foi erroneamente divulgada pelo partido - e em seguida tirada do ar.
Batizado apropriadamente de "Século Americano", o conjunto de propostas de política externa dos republicanos de hoje "honra" as ideias do ex-presidente Ronald Reagan (1981-89), de "paz através da força". O documento estabelece como objetivo conter as ameaças ao chamado "excepcionalismo americano" - "a convicção de que nosso país assume um lugar e um papel únicos na história humana", nas palavras do relatório.
'Ameaças'
Analistas reconhecem a mesma preocupação na política para a América Latina. Encabeçando a preocupação da proposta republicana estão Cuba e Venezuela, países que estariam "liderando um virulento movimento bolivariano antiamericano" na região. "O movimento bolivariano ameaça os aliados dos EUA, como a Colômbia, interfere na cooperação regional em assuntos cruciais como drogas ilícitas e contraterrorismo, provê refúgio para traficantes de drogas, incentiva organizações terroristas regionais, e inclusive convida o Irã e organizações terroristas estrangeiras, como o Hezbollah, para a região", diz o documento.
A isso se soma uma "epidemia violenta de gangues criminais e cartéis de drogas" que toma conta do México, América Central e Caribe. "À luz da gravidade do problema dos cartéis e o poder de fogo e a sofisticação das redes criminais", recomenda o documento republicano, "os Estados Unidos e o México devem explorar a necessidade para a cooperação no treinamento entre militares e no compartilhamento de inteligência", semelhante às práticas do Plano Colômbia.
O plano foi elaborado por um grupo de trabalho encabeçado pelo ex-embaixador para o Brasil Clifford Sobel e o analista sênior da conservadora Heritage Foundation Ray Walser, que não estavam disponíveis para dar entrevistas.
Eles consideram que o erro do governo do presidente democrata Barack Obama foi "fazer pouco para reverter essas tendências preocupantes", "permitindo a marcha em direção ao autoritarismo" e tardando três anos em firmar acordos de livre comércio com "aliados" como a Colômbia e o Panamá.
"Quando a campanha de Romney olha para a região, vê oportunidades de comércio e integração, mas há o componente de segurança", avalia o consultor José Cardenas, ex-conselheiro do governo republicano de George W. Bush para a América Latina, que não fez parte do comitê. "Sabemos que a região é pacífica e dominada pela democracia, mas sob este aspecto amplamente positivo de atividades, há o crescimento do crime organizado", disse Cárdenas à BBC Brasil.
"Não acho que a campanha queira simplesmente colocar as relações hemisféricas de volta a um cenário dominado só pela segurança, como foi durante a Guerra Fria. Mas vê (as relações) como algo que foi negligenciado e que precisa ser retomado, ao mesmo tempo também aproveitando a grande estabilidade política e econômica da região."
Carente de atenção
A crítica republicana a uma suposta "negligência" democrata para com a região é no mínimo curiosa considerando que, no fim do governo do republicano George W. Bush, às voltas com conflitos simultâneos no Iraque e no Afeganistão, tomava o sentido oposto.
Tanto que, nem bem havia se instalado na Casa Branca, o recém-empossado Obama prometia refundar a relação do seu país com a América Latina, durante a Cúpula das Américas realizada em Trinidad e Tobago, em abril de 2009. "Esta é uma queixa permanente", disse à BBC Brasil a especialista da Iniciativa para a América Latina do Instituto Brookings, Diana Negroponte. "É que, como não há nenhuma ameaça séria à segurança, o foco dos governos americanos estão sempre em outras partes."
O programa de política externa do governo Obama também ressalta fortemente a questão da segurança - mas no seu capítulo sobre a América Latina fala ainda de crescimento econômico, redução da desigualdade, energia e mudança climática.
Muitos céticos acham que na prática o governo americano continua dando prioridade a outras partes do mundo. Mas Negroponte crê que, se não no conteúdo, pelo menos o governo Obama mudou a forma da relação, estabelecendo parcerias "respeitosas e mútuas", voltadas para "projetos específicos em caráter bilateral".
Um bom exemplo é o Brasil, diz, com o qual os EUA cooperam na área comercial, educacional, tecnológica, de inovação e transparência governamental, entre outras. "Os dias das grandes parcerias se acabaram, não vamos criar uma alternativa à Unasul (bloco das nações sul-americanas)", argumenta a especialista. O que não quer dizer, acrescenta, "que este governo dê menos atenção à região" que o governo Bush.
Livre comércio
Nos raros momentos em que discute questões de política externa, Mitt Romney quase nunca menciona a América Latina. Mas José Cárdenas acredita que a ideia de integração com a região vem "mais fácil" para o republicano na área comercial.
Neste sentido, Cárdenas ecoa a tradicional opinião de que os republicanos, apontados como mais inclinados para o livre comércio, têm as mãos desamarradas comparados com os democratas para firmar acordos com os países ao sul.
Em seu programa, Romney promete colocar em marcha, nos primeiros cem dias de governo, uma campanha regional para "exaltar as virtudes da democracia e do livre comércio".
Mas o elemento da segurança continua presente: o objetivo final do plano é "prover um claro contraste com modelos autoritários" oferecidos por Venezuela e Cuba. "Sob o governo de Mitt Romney, os Estados Unidos perseguirão um papel ativo na América Latina, apoiando nossos aliados democráticos e relacionamentos baseados no mercado, contendo forças internas desestabilizadoras tais como gangues criminosas e terroristas, e se opondo a influências externas desestabilizadoras, como o Irã", relacionam os autores.

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