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UE toma decisões ousadas, mas implementação gera divergências

Promessa do uso mais flexível dos fundos de assistência financeira emergencial foi recebida como um passo ousado na direção certa

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BRUXELAS - As decisões tomadas pelos chefes de governo da União Europeia nesta sexta-feira, 27, que incluem a promessa do uso mais flexível dos fundos de assistência financeira emergencial e abrem caminho para que o Banco Central Europeu (BCE) tenha mais poderes na supervisão do setor bancário na zona do euro, foram recebidas como um passo ousado na direção certa.
Mas a inesperada declaração de unidade, divulgada na madrugada desta sexta, imediatamente deu lugar a uma série de condicionalidades e restrições, com os participantes do encontro de cúpula voltando a destacar, em suas entrevistas, as divergências que persistem. O ponto central do acordo é de que no futuro os dois veículos de assistência financeira da região, a Linha de Estabilidade Financeira Europeia (ESFS) e seu sucessor, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (ESM), poderão injetar capital diretamente nos bancos, evitando a necessidade de os governos individuais aumentarem sua dívida nesse processo. A decisão tem o potencial de beneficiar o balanço patrimonial dos governos, mas representa mais uma concessão de soberania nacional.
Espanha
Os participantes da cúpula também concordaram que os empréstimos a serem feitos à Espanha para a capitalização dos bancos desse país não serão considerada dívida sênior do governo espanhol. As duas decisões atendem a preocupações do mercado sobre o ciclo vicioso entre dívida bancária e dívida soberana. Como resultado disso, os prêmios de risco sobre os bônus governamentais da Espanha e da Itália caíram nesta sexta-feira, enquanto os dos bancos desses países dispararam.
"O projeto do euro agora é mais forte e tem mais credibilidade", disse em entrevista coletiva o primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy, principal defensor da ideia de que os mecanismos de assistência financeira multilaterais repassem recursos diretamente aos bancos. O também conservador primeiro-ministro britânico, David Cameron (cujo país não pertence à zona do euro), afirmou que "eles deram importantes passos à frente na noite passado, e eu aplaudo muito isso".
As declarações subsequentes de participantes da cúpula, porém, mostraram divergências grandes sobre aspectos importantes do acordo que eles acabavam de anunciar. Em contraste com seus colegas da Alemanha e da Holanda, o presidente da França, François Hollande, disse que uma cláusula crucial do documento de constituição do ESM foi mudada para permitir que decisões sejam tomadas sem a necessidade de unanimidade. Segundo Hollande, ao contrário da EFSF, "o ESM tem a vantagem de não necessitar de unanimidade".
A declaração surpreendeu funcionários da União Europeia, que disseram que ela não está em linha com o atual tratado de constituição do ESM, que deverá ser ratificado pela própria França e por outros países nas próximas semanas. De acordo com um diplomata europeu, "se Hollande disse isso, podemos voltar para casa e jogar fora o ESM, por que não é com isso que nós concordamos no tratado do ESM".
Alemanha
Já a chanceler alemã, Angela Merkel, esforçou-se em sua entrevista coletiva para tentar deixar claro que não abriu mão de nenhuma de suas posições, apesar das grandes mudanças ocorridas durante a noite no que defendia previamente. Segundo Merkel, o Parlamento alemão ainda manterá poder de veto sobre qualquer coisa de que não goste no novo ESM; ela acrescentou que o Parlamento alemão não só terá o direito de votar cada proposta de uso dos recursos do ESM, mas poderá vetar essas propostas e qualquer plano de mudanças no modo de atuação do fundo.
O texto original do tratado de constituição do ESM diz que as decisões sobre o uso dos recursos devem ser tomadas por unanimidade, mas permite que os recursos do fundo sejam mobilizados se houver 85% de votos favoráveis nos casos em que haja riscos para a estabilidade financeira da zona do euro como um todo.
Merkel também tentou destacar que outra decisão importante tomada nesta sexta, a de dar aos países da zona do euro acesso aos fundos de assistência financeira mesmo sem novas exigências de políticas específicas, não significa o abandono da posição de exigir medidas de austeridade. "Nós nos mantivemos completamente fiéis a nosso esquema existente, de dar uma coisa em troca de outra coisa: condicionalidade e supervisão", afirmou a chanceler.
Essas condicionalidades agora serão estabelecidas pela Comissão Europeia, como parte de seus relatórios anuais sobre cada um dos países membros. Os primeiros relatórios deste ano saíram em maio. Em princípio, enquanto um país estiver cumprindo as recomendações de políticas contidas no relatório da Comissão, ele poderá pedir apoio da EFSF ou do ESM para seu mercado de bônus, por meio de compras no mercado primário (o que equivaleria, na prática, a emitir dívida diretamente para o fundo em questão) ou no mercado aberto.
Itália
O primeiro-ministro da Itália, Mario Monti, se esforçou muito para que fosse aprovado esse mecanismo, que ele espera que remova o estigma político relacionado ao uso de recursos. Nesta sexta, ele disse que a Itália não pretende recorrer a esse mecanismo e deverá eliminar seus déficits estruturais até 2013.
Boa parte do que foi aprovado dependerá do estabelecimento - por unanimidade - de um novo órgão supervisor dos bancos europeus, o primeiro passo na direção de uma união bancária. Isso exigirá discussões delicadas sobre quais serão os poderes específicos desse novo órgão. Também envolverá negociações paralelas sobre a criação de um sistema europeu de garantia de depósitos e um protocolo único para a solução de falências de bancos.
Essas negociações vão começar num cenário de desequilíbrio no setor bancário europeu, no qual os bancos da Alemanha, da Holanda e da Finlândia, vistos como "refúgios seguros", estão forrados de dinheiro de depositantes corporativos e de varejo, enquanto os de países como Grécia, Espanha, Itália, Portugal e Irlanda continuam totalmente dependentes do BCE.
Segundo Merkel, "os detalhes sobre os passivos ainda terão de ser negociados individualmente, e posso prever agora que as negociações serão muito difíceis, porque estamos num novo território. Por isso, elas, não vão levar apenas dez dias".
Decisões
Os chefes de governo reunidos em Bruxelas deram a seus ministros das Finanças apenas dez dias para adotarem as medidas básicas para a implementação das decisões da cúpula. Mas, num sinal claro de que a ajuda direta aos bancos poderá estar disponível somente em 2013, ficou decidido que os países da zona do euro terão até o fim deste ano para chegar a um acordo sobre a questão da supervisão bancária.
Alguns participantes perceberam nisso o mesmo tipo de vácuo entre a decisão e a implementação que tem prejudicado as estratégias de combate à crise da zona do euro desde 2010. "Temos um acordo em princípio, mas o Diabo vive nos detalhes. A unanimidade que a Alemanha quer poderá ser um ponto de divergência", comentou um alto funcionário

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