Europa limita asilo a refugiados sírios
Dos 2,5 milhões que abandonaram a Síria desde 2011, só 70 mil conseguiram refúgio na Europa; ONGs criticam descaso francês
PARIS - Depois de três meses dormindo em hotéis, pensões, dentro de automóveis ou ao léu em uma praça pública de Saint-Ouen, periferia de Paris, Kader al-Nasser, de 26 anos, teve enfim, na quinta-feira, motivos para comemorar. Abraçado ao filho, de um ano e meio, ele e 164 outros refugiados da Síria receberam os primeiros documentos provisórios na França - o que lhes garante a permanência no país sem o risco imediato de expulsão.
Como o comerciante, milhares de outros homens, mulheres e crianças, parte deles doentes e impregnados de infecções como sarna, lutam por asilo político e pelo status de refugiados de guerra na Europa.
O sonho de viver em segurança, porém, enfrenta a pouca disposição dos países europeus em socorrer as vítimas do conflito, que desde março de 2011 já deixou mais de 150 mil mortos. De acordo com as Nações Unidas, 2,5 milhões de sírios já deixaram o país desde então, mas destes apenas 70,7 mil foram admitidos como refugiados na Europa, a maior parte na Alemanha e na Suécia.
Com reputação de "terra de asilo", a França só aceitou 1,7 mil pessoas em 37 meses da guerra civil contra o regime de Bashar Assad. Em comparação, o Líbano, país vizinho à Síria, já acolheu 1 milhão de refugiados no mesmo período - proporcionalmente, esse número equivaleria a 11 milhões de pessoas em solo francês.
O tema voltou a ganhar relevância em Paris na semana passada graças à mobilização de organizações não governamentais empenhadas em socorrer sírios em fuga do conflito. Juntas, Reviver e França Terra de Asilo (FTA) denunciaram o descaso do Ministério do Interior, que até então não aceitara as demandas de regularização dos 165 refugiados que vagavam em grupo pelas ruas de Saint-Ouen.
Na quinta-feira, o Estado encontrou as famílias, rodeadas de lixo e espalhadas em um estacionamento público. Imigrantes que deixaram cidades como Homs, Hamah, Alepo e áreas de Damasco conflagradas pelos choques entre o Exército de Assad e grupos rebeldes.
Parte do grupo vaga há três anos pelo Oriente Médio, pelo Norte da África e pela Europa em busca de abrigo, passando por Líbano, Jordânia, Egito, Líbia, Tunísia, Marrocos e Argélia antes de chegar de forma ilegal ao território europeu.
"Ontem, minha mulher, meus três filhos e eu dormimos na rua. Não temos mais nenhum centavo", disse Al-Nasser, que fugiu da Síria após ser libertado da prisão.
Tortura
Detido "para averiguações" em casa, diante da família, o comerciante deveria permanecer na delegacia "por cinco minutos", mas desapareceu por oito meses sem jamais dar notícias. Na prisão, passou por sessões de tortura, choques elétricos e espancamentos que ainda marcam seu corpo. "Eu nem mesmo era um rebelde", disse.
No mesmo grupo de imigrantes estava Mohamed al-Nassan, empresário de 46 anos, que há um ano e meio deixou o bairro de Bab al-Amer, em Homs, com a mulher e seus oito filhos. "O Exército mandou que meu filho se alistasse para fazer a guerra contra outros muçulmanos. Como eu poderia permitir?", questionou.
Antes de abandonar o país, Al-Nassan deixou US$ 100 mil em "contribuições" ao Exército, fugindo com US$ 36 mil - dinheiro que, de acordo com ele, acabou.
Yannis, de 30 anos, também comerciante, contou que o grupo é constituído por sunitas, a confissão predominante entre os rebeldes. Mas, segundo ele, a maioria da população não escolhe mais lados. "Somos vítimas desse conflito", disse, seguido pela mulher, de 25 anos, que não quis se identificar. "Nós, mulheres, temos pânico de tudo. Na Síria, a qualquer momento, alguém pode invadir nossas casas e nos violentar ou matar."
As ONGs que lhes prestam apoio confirmam o sofrimento dos candidatos ao asilo. "A situação é extremamente crítica, com situações sanitárias e sociais problemáticas. Crianças estão ao léu, mulheres grávidas enfrentam situações médicas preocupantes e a condição jurídica de todos é muito instável", resume Pierre Henry, diretor-geral da FTA.
A emergência, porém, não parece sensibilizar as autoridades. No ano passado, a ONU solicitou que governos europeus autorizassem 30 mil "recolocações" de refugiados de guerra - um número ínfimo comparado à amplitude do êxodo. Ainda assim, o governo alemão aceitou 10 mil e o francês, 500. "Quinhentas pessoas não é nada, sobretudo se pensarmos no papel que a França quis desempenhar no conflito na Síria", lembra Jean-François Dubost, responsável pelo programa de refugiados da Anistia Internacional.
Pressionado pela imprensa e pela opinião pública, o governo reagiu no fim da semana, realizando um mutirão para registrar os pedidos de asilo do grupo de sírios de Saint-Ouen, reduzindo o risco de expulsão no curto prazo.
O sonho de viver em segurança, porém, enfrenta a pouca disposição dos países europeus em socorrer as vítimas do conflito, que desde março de 2011 já deixou mais de 150 mil mortos. De acordo com as Nações Unidas, 2,5 milhões de sírios já deixaram o país desde então, mas destes apenas 70,7 mil foram admitidos como refugiados na Europa, a maior parte na Alemanha e na Suécia.
Com reputação de "terra de asilo", a França só aceitou 1,7 mil pessoas em 37 meses da guerra civil contra o regime de Bashar Assad. Em comparação, o Líbano, país vizinho à Síria, já acolheu 1 milhão de refugiados no mesmo período - proporcionalmente, esse número equivaleria a 11 milhões de pessoas em solo francês.
O tema voltou a ganhar relevância em Paris na semana passada graças à mobilização de organizações não governamentais empenhadas em socorrer sírios em fuga do conflito. Juntas, Reviver e França Terra de Asilo (FTA) denunciaram o descaso do Ministério do Interior, que até então não aceitara as demandas de regularização dos 165 refugiados que vagavam em grupo pelas ruas de Saint-Ouen.
Na quinta-feira, o Estado encontrou as famílias, rodeadas de lixo e espalhadas em um estacionamento público. Imigrantes que deixaram cidades como Homs, Hamah, Alepo e áreas de Damasco conflagradas pelos choques entre o Exército de Assad e grupos rebeldes.
Parte do grupo vaga há três anos pelo Oriente Médio, pelo Norte da África e pela Europa em busca de abrigo, passando por Líbano, Jordânia, Egito, Líbia, Tunísia, Marrocos e Argélia antes de chegar de forma ilegal ao território europeu.
"Ontem, minha mulher, meus três filhos e eu dormimos na rua. Não temos mais nenhum centavo", disse Al-Nasser, que fugiu da Síria após ser libertado da prisão.
Tortura
Detido "para averiguações" em casa, diante da família, o comerciante deveria permanecer na delegacia "por cinco minutos", mas desapareceu por oito meses sem jamais dar notícias. Na prisão, passou por sessões de tortura, choques elétricos e espancamentos que ainda marcam seu corpo. "Eu nem mesmo era um rebelde", disse.
No mesmo grupo de imigrantes estava Mohamed al-Nassan, empresário de 46 anos, que há um ano e meio deixou o bairro de Bab al-Amer, em Homs, com a mulher e seus oito filhos. "O Exército mandou que meu filho se alistasse para fazer a guerra contra outros muçulmanos. Como eu poderia permitir?", questionou.
Antes de abandonar o país, Al-Nassan deixou US$ 100 mil em "contribuições" ao Exército, fugindo com US$ 36 mil - dinheiro que, de acordo com ele, acabou.
Yannis, de 30 anos, também comerciante, contou que o grupo é constituído por sunitas, a confissão predominante entre os rebeldes. Mas, segundo ele, a maioria da população não escolhe mais lados. "Somos vítimas desse conflito", disse, seguido pela mulher, de 25 anos, que não quis se identificar. "Nós, mulheres, temos pânico de tudo. Na Síria, a qualquer momento, alguém pode invadir nossas casas e nos violentar ou matar."
As ONGs que lhes prestam apoio confirmam o sofrimento dos candidatos ao asilo. "A situação é extremamente crítica, com situações sanitárias e sociais problemáticas. Crianças estão ao léu, mulheres grávidas enfrentam situações médicas preocupantes e a condição jurídica de todos é muito instável", resume Pierre Henry, diretor-geral da FTA.
A emergência, porém, não parece sensibilizar as autoridades. No ano passado, a ONU solicitou que governos europeus autorizassem 30 mil "recolocações" de refugiados de guerra - um número ínfimo comparado à amplitude do êxodo. Ainda assim, o governo alemão aceitou 10 mil e o francês, 500. "Quinhentas pessoas não é nada, sobretudo se pensarmos no papel que a França quis desempenhar no conflito na Síria", lembra Jean-François Dubost, responsável pelo programa de refugiados da Anistia Internacional.
Pressionado pela imprensa e pela opinião pública, o governo reagiu no fim da semana, realizando um mutirão para registrar os pedidos de asilo do grupo de sírios de Saint-Ouen, reduzindo o risco de expulsão no curto prazo.
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