Rússia já entregou baterias antiaéreas à Síria, diz Assad
Enquanto Europa estuda armar rebeldes, regime recebe armamentos, mesmo com pressões da comunidade internacional
Dois dias depois de o vice-chanceler da Rússia, Sergei Ryabkov, prometer
fornecer à Síria sistemas de defesa antiárea como retaliação ao apoio político
da Europa aos rebeldes, o ditador Bashar Assad anunciou ontem já ter a posse dos
equipamentos. A suposta entrega da carga revela a escalada militar da guerra
civil antes da conferência internacional de Genebra que pretende chegar em junho
a um acordo para o fim do conflito, que já matou mais de 80 mil pessoas em 26
meses.
A confirmação da entrega das armas foi feito por Assad em entrevista à rede
de TV libanesa Al-Manar, ligada ao movimento armado xiita Hezbollah, que por sua
vez apoia o regime sírio. A entrevista foi ao ar na noite de ontem, mas seus
principais trechos foram antecipados pelo jornal libanês Al-Akhbar. “A Síria
recebeu uma primeira carga de mísseis antiaéreos russos S-300. O resto da carga
chegará em breve”, confirmou o ditador.
Questionado sobre o papel do Hezbollah nos confrontos mais recentes, Assad
confirmou a ligação com o grupo, mas não foi taxativo em reconhecer que os
jihadistas participam da guerra do outro lado da fronteira, em território sírio.
“A Síria e o Hezbollah fazem parte do mesmo eixo”, disse ele, ponderando a
seguir: “O Exército sírio é o que luta e que comanda os combates contra os
grupos armados, e este combate continuará até que todos os terroristas sejam
eliminados”.
Na terça-feira, um dia depois de a União Europeia suspender o embargo ao
fornecimento de armas aos rebeldes da Síria, Riabkov havia afirmado que a Rússia
pretendia fornecer mísseis S-300 para baterias antiáreas do regime, com o
objetivo de “estabilizar” o conflito e “dissuadir” interventores
internacionais.
Em resposta, o ministro israelense de
Energia, Sylvan Shalom, afirmou que Israel pode voltar a intervir com
bombardeios ao país vizinho, mas apenas se as armas forem usadas contra seu
país. “Há anos a Síria dispõe de armas estratégicas. O problema se colocará se
houver risco de essas armas caírem em mãos de outros e serem usadas contra nós”,
explicou Shalom. “Nesse caso, nós deveríamos agir.”
Cenário sombrio. A corrida armamentista na Síria é mais um dos elementos
que preocupa a Comissão Internacional de Inquérito para a Síria das Nações
Unidas. A comissão prepara para o dia 5 a divulgação de um relatório “muito
sombrio”, segundo afirmou ao Estado o coordenador da comissão, o diplomata
brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, sobre os crimes de guerra cometidos por ambos
os lados.
Para Pinheiro, o eventual fornecimento de armas pela Europa aos rebeldes
abre o risco de que o material bélico acabe nas mãos de radicais islâmicos.
“Nossa preocupação é de que isso possa fortalecer grupos menos imbuídos dos
valores da democracia e dos direitos humanos”, disse Pinheiro. “Há vários grupos
que têm como objeto a transformação da Síria em um califado, a dominância de uma
religião sobre as outras. No início da rebelião, os valores democráticos estavam
presentes. Agora foram recobertos.”
Pinheiro ainda tem esperança na conferência de Genebra, em preparação por
Rússia e EUA, mas admitiu temer que o eventual fornecimento de armas aos
revolucionários pela UE acabe fortalecendo o conflito e alimentando o poder de
grupos jihadistas. “O sectarismo, a radicalização e o aumento das violações de
direitos humanos deixam de lado os valores da democracia.”
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