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Ditadores devem temer as cidades

Ditadores devem temer as cidades

Bastiões da resistência aos regimes autoritários, grandes concentrações urbanas não se rendem ao controle ditatorial

22 de julho de 2013 | 2h 02
É EDITOR DA FOREIGN POLICY - O Estado de S.Paulo
Entre Cairo, Teerã e Moscou, algumas das principais metrópoles do mundo, vimos nos últimos anos inúmeros exemplos de dramáticos confrontos entre governos autocráticos e suas respectivas populações.

Mas existirá uma relação mensurável entre urbanização e políticas antiautoritárias? Em um ensaio que escreveu para o Journal of Politics, Jeremy Wallace, da Ohio State University, afirma que sim:
"Para os 237 regimes com níveis de concentração urbana acima da média, sua duração média é de 8,6 anos e a taxa de mortalidade anual de 9,2%. Para os 198 regimes caracterizados por baixos níveis de concentração urbana, a taxa de incidência é de apenas 5,6% e a duração média de 12,4 anos. Regimes com capitais que dominam a paisagem urbana se deterioram quase quatro anos mais cedo e suas taxas de mortalidade são 60% mais elevadas."
As cidades são um problema para o controle autoritário, afirma-se tradicionalmente, porque, por concentrarem grandes massas da população, melhoram as redes de comunicação, permitindo que sentimentos contrários ao governo possam se difundir. Em termos físicos, bairros muito populosos são também centros de resistência ideais, porque podem ser facilmente bloqueados por barricadas e são repletos de locais para pessoas se esconderem. Por outro lado, as enormes avenidas de capitais como Washington, Paris e Pequim têm um propósito prático e também estético: permitir a fácil movimentação da polícia ou do Exército nos tumultos civis.
Wallace argumenta que os regimes autoritários dão muito mais atenção às grandes cidades do que às áreas rurais porque sabem que é ali que a resistência estará arraigada. Mas, afirma, esses esforços poderão se tornar contraproducentes, porque encorajam as pessoas a se mudar para as cidades. É possível que esse problema se agrave nos próximos anos no caso da China, onde a urbanização se dá em ritmo acelerado e o governo costuma levar menos a sério os milhares de protestos que ocorrem todos os anos nas aldeias rurais do que qualquer outro sinal de oposição organizada nas grandes cidades.
A pesquisa de Wallace também afirma que as ditaduras de países com grandes capitais centralizadas são mais vulneráveis do que os que contam com vários grandes centros urbanos: por exemplo, o Egito, em contraposição à Síria. Sua conclusão parece estar de certo modo relacionada à pesquisa de Filipe Campante e Do Quoc-anh sobre o nexo entre o isolamento das capitais e a corrupção.
Também questiono se existe uma relação entre a concentração urbana e a eficácia das manifestações populares nas democracias. Os protestos que se denominaram Ocupe Wall Street, de 2011 e 2012, se espalharam para dezenas de outras cidades nos Estados Unidos, mas será que seu impacto teria sido maior se o poder político e econômico dos EUA se concentrasse em uma única cidade, como em Paris ou Atenas? Ao que tudo indica, países como França e Grécia têm uma maior tradição de protestos de rua, que em geral influenciam diretamente a legislação, do que os Estados Unidos ou mesmo o Brasil.
Bastiões da resistência aos regimes autoritários, grandes concentrações urbanas não se rendem ao controle ditatorial 
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"Para os 237 regimes com níveis de concentração urbana acima da média, sua duração média é de 8,6 anos e a taxa de mortalidade anual de 9,2%. Para os 198 regimes caracterizados por baixos níveis de concentração urbana, a taxa de incidência é de apenas 5,6% e a duração média de 12,4 anos. Regimes com capitais que dominam a paisagem urbana se deterioram quase quatro anos mais cedo e suas taxas de mortalidade são 60% mais elevadas."
As cidades são um problema para o controle autoritário, afirma-se tradicionalmente, porque, por concentrarem grandes massas da população, melhoram as redes de comunicação, permitindo que sentimentos contrários ao governo possam se difundir. Em termos físicos, bairros muito populosos são também centros de resistência ideais, porque podem ser facilmente bloqueados por barricadas e são repletos de locais para pessoas se esconderem. Por outro lado, as enormes avenidas de capitais como Washington, Paris e Pequim têm um propósito prático e também estético: permitir a fácil movimentação da polícia ou do Exército nos tumultos civis.
Wallace argumenta que os regimes autoritários dão muito mais atenção às grandes cidades do que às áreas rurais porque sabem que é ali que a resistência estará arraigada. Mas, afirma, esses esforços poderão se tornar contraproducentes, porque encorajam as pessoas a se mudar para as cidades. É possível que esse problema se agrave nos próximos anos no caso da China, onde a urbanização se dá em ritmo acelerado e o governo costuma levar menos a sério os milhares de protestos que ocorrem todos os anos nas aldeias rurais do que qualquer outro sinal de oposição organizada nas grandes cidades.
A pesquisa de Wallace também afirma que as ditaduras de países com grandes capitais centralizadas são mais vulneráveis do que os que contam com vários grandes centros urbanos: por exemplo, o Egito, em contraposição à Síria. Sua conclusão parece estar de certo modo relacionada à pesquisa de Filipe Campante e Do Quoc-anh sobre o nexo entre o isolamento das capitais e a corrupção.
Também questiono se existe uma relação entre a concentração urbana e a eficácia das manifestações populares nas democracias. Os protestos que se denominaram Ocupe Wall Street, de 2011 e 2012, se espalharam para dezenas de outras cidades nos Estados Unidos, mas será que seu impacto teria sido maior se o poder político e econômico dos EUA se concentrasse em uma única cidade, como em Paris ou Atenas? Ao que tudo indica, países como França e Grécia têm uma maior tradição de protestos de rua, que em geral influenciam diretamente a legislação, do que os Estados Unidos ou mesmo o Brasil.

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