Pular para o conteúdo principal

Das 200 maiores empresas do Brasil, apenas três têm uma mulher no comando

A dupla jornada - em casa e no trabalho -, a falta de oportunidades e também o preconceito são alguns dos motivos que explicam a brutal diferença

Solange Ribeiro, CEO da Neoenergia
Solange Ribeiro é CEO da Neoenergia, empresa que tem quatro mulheres em sua diretoria, composta por sete executivos
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), já atestou que as mulheres recebem, em média, 74,5% dos salários dos homens no país. Mas o fosso entre gêneros não se restringe aos trabalhadores assalariados: das 200 maiores empresas brasileiras, apenas três têm uma mulher no seu posto mais alto de comando.
Claudia Sender, principal executiva da TAM, Solange Ribeiro, da Neoenergia, e Sinara Chenna, da Copasa, são as únicas mulheres em um universo predominantemente masculino. O levantamento, feito pelo site de VEJA na semana que antecedeu o Dia Internacional da Mulher, celebrado neste 8 de março, usou como critério a receita líquida das companhias e considerou apenas as profissionais que ocupam o principal posto executivo. Não foram considerados os nomes que eventualmente ocupem a presidência de conselhos de administração.
A dupla jornada - em casa e no trabalho -, a falta de oportunidades e também o preconceito são alguns dos motivos que explicam o fato de apenas 1,5% das 200 maiores empresas brasileiras terem uma mulher em seu comando, a despeito de 57% dos recém-formados nas universidades serem mulheres. "O Brasil resistiu muito à discussão de gêneros, sempre levando o tema na brincadeira, e isso fez com que não houvesse evoluções práticas", diz Regina Madalozzo, professora do Insper que se dedica a pesquisas sobre a atuação feminina no mercado de trabalho.
Segundo a professora, na percepção da maioria das empresas, as mulheres não têm o que é necessário para conseguir chegar a um cargo de CEO (sigla em inglês para principal executivo). "Se ela é comunicativa e pede muita opinião, é considerada 'soft' demais", afirma. "Mas se ela tiver um perfil mais agressivo, falar de maneira mais firme, ela é agressiva demais. Há uma avaliação muito mais dura de comportamento das mulheres em relação ao dos homens."
Outro fator para o fosso entre homens e mulheres no comando de grandes empresas é que as mulheres não foram treinadas para competir como os homens foram, acredita a professora. "No passado, era feio uma mulher competir", afirma. "É preciso que as empresas façam programas de mentoria para mostrar às mulheres como e de que maneira competir."
Divisão do trabalho doméstico - O mais recente Relatório de Desigualdade de Gênero do Fórum Econômico Mundial mostra que os países nórdicos europeus são os mais equilibrados profissionalmente. A Islândia, primeira colocada entre os países com maior igualdade no trabalho para mulheres, é um exemplo disso. Um dos motivos que explicam esse equilíbrio, segundo o relatório, é a grande participação masculina na divisão de trabalho doméstico, o que faz com que sobre mais tempo para as mulheres se dedicarem a seus empregos e buscarem melhores posições.
No Brasil, a sobrecarga de mulheres que têm que se dividir entre a vida profissional e os afazeres domésticos é um dos maiores responsáveis pela falta de mulheres em altos cargos - e quem diz isso é uma das exceções no universo dos altos executivos. " Tanto a minha vida quanto a do meu marido, que também trabalha, são muito puxadas, mas mesmo assim há uma divisão de tarefas em casa", diz Solange Ribeiro, CEO da Neoenergia. "Esse apoio é muito importante."
Claudia Sender, presidente da TAM, conta que também chegou a um equilíbrio em sua casa. "Tenho um parceiro que abraçou a causa da liderança feminina comigo, me ajudou a pensar mais alto, sempre acreditou e me apoiou dentro e fora de casa. Isso faz com que a jornada seja mais fácil", diz.
Leia também:
Relação de vagas de trabalho por candidato cai 30% em 2015, diz pesquisa
Nova presidente da TAM, Claudia Sender
Nova presidente da TAM, Claudia Sender
Mudança na base - Nessas duas empresas de exceção, o protagonismo feminino não se restringe ao cargo mais alto. A diretoria da Neoenergia tem sete integrantes, sendo três mulheres e quatro homens. Na TAM, metade da diretoria é composta por mulheres. "Ainda somos minoria, mas o quadro pouco a pouco vem mudando", diz a CEO da empresa aérea.
A TAM determinou que ao menos uma mulher será sempre avaliada em processos para a definição de cargos de liderança. Não há, assim, uma cota a ser preenchida, mas a abertura de oportunidades para que mulheres assumam, por mérito, postos de chefia. E não se trata apenas de uma questão de gênero, mas de estratégia empresarial. "Uma liderança homogênea corre o risco de criar um produto que não vai agradar a tanta gente", diz a CEO da TAM.
Outras empresas, que - ainda - não têm uma mulher no comando ou em seus principais postos executivos, já trabalham para equilibrar a balança. Companhias como IBM, Boticário, Natura, Furnas e Vale têm programas que incentivam o recrutamento de trabalhadoras mulheres.
Vania Somavilla, diretora-executiva de Recursos Humanos, Saúde e Segurança, Sustentabilidade e Energia da Vale, conta que a mineradora começou recentemente a colocar mulheres em funções que historicamente eram ocupadas por homens. Há hoje na empresa, por exemplo, mulheres motoristas de caminhão fora de estrada. "O número de acidentes caiu", afirma a diretora. "Isso reduziu nossos custos com seguros."
Esse tipo de ação exige mudança de mentalidade. "As empresas deixam de contratar a melhor administradora do país para não pagar licença-maternidade, por exemplo", diz Carmen Migueles, professora da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, da Fundação Getulio Vargas. "Essas empresas são muito ruins em inteligência competitiva e inovação porque focam no corte de custos, perdendo qualidade de liderança." A professora é uma das maiores referências brasileiras em cultura organizacional e coautora de livros como Liderança baseada em valores (Ed. Elsevier).
As mulheres não chegarão ao topo das maiores empresas brasileiras apenas para assegurar o equilíbrio de gêneros nos postos de comando, mas é preciso que elas ao menos tenham a oportunidade de disputar esses postos. "As pessoas têm que entender que não é homem contra mulher", diz Claudia Sender, da TAM. "É como a inserção da mulher no mercado pode ajudar a todos."

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Atuação que não deixam dúvidas por que deveremos votar em Felix Mendonça para Deputado Federal. NÚMERO  1234 . Félix Mendonça Júnior Félix Mendonça: Governo Ciro terá como foco o desenvolvimento e combate às desigualdades sociais O deputado Félix Mendonça Júnior (PDT-BA) vê com otimismo a pré-candidatura de Ciro Gomes à Presidência da República. A tendência, segundo ele, é de crescimento do ex-governador do Ceará. “Ciro é o nome mais preparado e, com certeza, a melhor opção entre todos os pré- candidatos. Com a campanha nas Leia mais Movimentos apoiam reivindicação de vaga na chapa de Rui Costa para o PDT na Bahia Neste final de semana, o cenário político baiano ganhou novos contornos após a declaração do presidente estadual do PDT, deputado federal Félix Mendonça Júnior, que reivindicou uma vaga para o partido na chapada majoritária do governador Rui Costa (PT) na eleição de 2018. Apesar de o parlamentar não ter citado Leia mais Câmara aprova, com...
Ex-presidente da Petrobras tem saldo de R$ 3 milhões em aplicações A informação foi encaminhada pelo Banco do Brasil ao juiz Sergio Moro N O ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine (Foto: Cristina Indio do Brasil/Agência Brasil) Em documento encaminhado ao juiz federal Sergio Moro no dia 31 de outubro, o Banco do Brasil informou que o ex-presidente da Petrobras e do BB Aldemir Bendine acumula mais de R$ 3 milhões em quatro títulos LCAs emitidos pela in...
Grécia e credores se aproximam de acordo em Atenas Banqueiros e pessoas próximas às negociações afirmam que acordo pode ser selado nos próximos dias Evangelos Venizelos, ministro das Finanças da Grécia (Louisa Gouliamaki/AFP) A Grécia e seus credores privados retomam as negociações de swap de dívida nesta sexta-feira, com sinais de que podem estar se aproximando do tão esperado acordo para impedir um caótico default (calote) de Atenas. O país corre contra o tempo para conseguir até segunda-feira um acordo que permita uma nova injeção de ajuda externa, antes que vençam 14,5 bilhões de euros em bônus no mês de março. Após um impasse nas negociações da semana passada por causa do cupom, ou pagamento de juros, que a Grécia precisa oferecer em seus novos bônus, os dois lados parecem estar agindo para superar suas diferenças. "A atmosfera estava boa, progresso foi feito e nós continuaremos amanhã à tarde", d...