Delação de Marcos Valério atinge FHC, Lula e Aécio
Segundo a Folha apurou, a colaboração com a PF incorpora 60 anexos (relatos de episódios de supostas irregularidades) que haviam sido rejeitados pela Procuradoria-Geral da República e pelo Ministério Público de Minas Gerais. O novo acordo ainda ampliaria a lista de implicados.
A delação, assinada neste mês, foi enviada ao STF (Supremo Tribunal Federal) e depende de homologação. Não está claro quais episódios serão considerados e investigados pela PF.
Valério escreveu a delação à mão na prisão e teve os anexos posteriormente digitados. Os relatos contêm erros de grafia, além de equívocos em nomes de personagens e datas.
Condenado a mais de 37 anos de prisão pelo mensalão, Valério também é réu acusado de operar desvios por meio de suas agências de publicidade, a SMP&B e a DNA Propaganda, para financiar a fracassada campanha de reeleição do então governador mineiro, Eduardo Azeredo (PSDB), em 1998.
Uma planilha assinada pelo publicitário aponta que a campanha recebeu cerca de R$ 10 milhões (R$ 33 milhões hoje) em desvios de estatais como a Cemig, Copasa, Furnas, Comig, Eletrobras, Petrobras, Correios, Banco do Brasil e Banco do Estado de Minas Gerais, que seria privatizado ainda em 1998.
O documento, com data de 1999, foi entregue à PF. O relatório aponta ainda que quase R$ 48 milhões (R$ 159 milhões atuais) foram obtidos via empréstimos, especialmente com o Banco Rural. As dívidas, segundo os anexos, seriam quitadas por construtoras, como a ARG e a Andrade Gutierrez.
De acordo com o controle de Valério, foram arrecadados e distribuídos ao menos R$ 104 milhões (R$ 346 milhões corrigidos) na campanha. A lista de recebedores inclui políticos e membros do Judiciário.
Segundo a narrativa do publicitário, o esquema de empréstimos fraudulentos do Banco Rural e ainda um repasse de R$ 1 milhão da Usiminas via caixa dois beneficiaram também as campanhas de FHC (1998), Aécio (2002) e Serra (2002). A siderúrgica também foi usada na eleição de Lula, em 2002, conta Valério.
Os anexos afirmam que Serra atuou, após perder a eleição presidencial de 2002, para resolver pendências do Banco Rural e, em troca, teve R$ 1 milhão de dívidas de campanha pagos pelo banco por meio da SMP&B.
PROPINA
Valério relata, nos anexos apresentados ao Ministério Público, pagamento de propina em troca da obtenção de contratos para suas agências. Durante o governo FHC, afirma, a DNA propaganda repassou a Aécio 2% do faturamento do seu contrato com o Banco do Brasil, que havia sido arranjado pelo senador com o aval do ex-presidente.
O publicitário conta que, no governo Lula, pagava R$ 50 mil por mês ao ex-ministro José Dirceu (PT) como acerto por uma conta de publicidade dos Correios. A troca de favores teria se repetido em órgãos como a Câmara dos Deputados, o ministério dos Esportes e a Assembleia de Minas, entre outros.
Valério afirmou ainda que Aécio encontrou-se, em Belo Horizonte, com a diretoria do Banco Rural e com os então deputados Eduardo Paes (PMDB-RJ) e Carlos Sampaio (PSDB-SP), da CPI dos Correios, de 2005, para blindar investigações sobre a campanha de Azeredo. A maquiagem de dados do banco pelo tucano foi delatada também pelo ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS).
Em outra CPI, a do Banestado, de 2003, o Banco Rural, segundo Valério, repassou R$ 500 mil a parlamentares por meio do deputado federal José Mentor (PT-SP) para escapar de acusações.
MENSALÃO
Os 60 anexos iniciais de Valério narram que o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, foi nomeado pelo ex-presidente para ser o contato com a SMP&B em meio à crise do mensalão, em 2005, e acertou um pagamento via Andrade Gutierrez.
"Ficou acertado uma ajuda no valor de R$ 5 milhões para pagar as despesas dos advogados [...]. Ele nos falou que a construtora Andrade Gutierrez faria o pagamento [...]. Pagamos os advogados dos réus, dando um pouco para cada um dos seis réus do núcleo político", relata.
Valério diz ainda que, junto com o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, articulou um encontro entre o banqueiro Daniel Dantas e o ex-ministro Antonio Palocci para resolver problemas do Grupo Opportunity com o governo Lula.
Em troca, a Brasil Telecom, controlada pelo grupo, contratou serviços superfaturados do publicitário Duda Mendonça no valor de R$ 12 milhões.
Os anexos relatam ainda uma série de episódios envolvendo propina, como o pagamento de uma reforma no estádio do Morumbi e em prefeituras mineiras.
TENTATIVAS
As tratativas para delação começaram ainda em meados no ano passado. Um ofício de junho do Ministério Público de MG pede que os relatos sejam enviados à PGR por tratarem de políticos com foro privilegiado no STF. A Procuradoria chegou a enviar representantes a Minas, mas não levou o acerto adiante.
Uma nova tentativa com a 17ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de BH foi recusada em março deste ano.
Sete réus do mensalão tucano, incluindo Válério, ainda aguardam julgamento. O episódio gerou, até agora, a condenação de Azeredo a 20 anos e dez meses de prisão por peculato e lavagem de dinheiro. O julgamento em segunda instância está marcado para o próximo dia 8.
OUTRO LADO
A defesa do ex-governador de Minas Eduardo Azeredo (PSDB-MG) afirma que não irá fazer comentários antes de ter acesso à delação.
Alberto Toron, advogado do senador Aécio Neves (PSDB-MG), diz que as acusações de Marcos Valério são falsas e que o publicitário "busca, reiterada e desesperadamente, benesses para amenizar sua pena".
"Muitas das acusações que agora faz contra o senador Aécio Neves, antigamente fazia contra o PT. Seu discurso se amolda e seus personagens se alteram, não de acordo com a verdade, mas de acordo com seus interesses privados e escusos", diz Toron.
O advogado argumenta que o contrato da DNA, de Valério, com o Banco do Brasil foi firmado em 1994, antes do governo Fernando Henrique Cardoso. "O próprio Ministério Público, em outras oportunidades, reconheceu e descartou as inverdades dos discursos proferidos pelo sr. Marcos Valério."
A assessoria do ex-presidente FHC afirma que ele desconhece a delação e qualquer pagamento de caixa dois em sua campanha à reeleição.
A assessoria do senador José Serra (PSDB-SP) afirmou que "todas as suas campanhas eleitorais foram conduzidas dentro da lei, com as finanças sob responsabilidade do partido". "Acusações dessa natureza envolvendo o senador são descabidas e completamente absurdas."
A assessoria do Instituto Lula afirma que, desde 2012, Valério faz acusações sem provas contra o PT e contra o ex-presidente Lula. Diz ainda que todas as investigações foram arquivadas pelo MP e que Paulo Okamotto não irá comentar suposições de delações.
O advogado de José Dirceu, Roberto Podval, diz que dar credibilidade a Valério é "desacreditar o próprio instituto da delação, que deve ser tratado com responsabilidade".
O deputado José Mentor (PT-SP) afirmou não ter conhecimento da delação e que "não tratou de qualquer assunto da CPI do Banestado com Valério".
A assessoria do Banco Opportunity afirma que Daniel Dantas não se encontrou com o então ministro Antonio Palocci. "Delúbio Soares pediu ao Opportunity que o ajudasse a pagar dívidas do PT, o que foi rejeitado."
Segundo a assessoria, a agência de Duda Mendonça foi responsável pelo lançamento da Brasil Telecom GSM, empresa de celular. O publicitário sugeriu o plano "Pula-Pula: o consumidor pagava num mês, não pagava no outro –o que era fácil de entender e foi sucesso."
A defesa de Duda Mendonça preferiu não se manifestar. A defesa de Delúbio afirma que não teve acesso à delação, mas reafirmou que o ex-tesoureiro do PT nunca cometeu qualquer ato ilegal e está à disposição para esclarecimentos.
A assessoria da Andrade Gutierrez afirma que a empresa, que firmou acordo de leniência, não vai comentar a delação, mas "reforça seu compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado".
A Folha não obteve sucesso no contato com o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (PMDB), com o deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP) e com o ex-ministro Antonio Palocci nesta sexta (21).
Lula Marques - 6.jul.2005/Folhapress | ||
Marcos Valério, em 2005; condenado no mensalão, o publicitário agora entregou 60 ane |
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O acordo de delação firmado entre o publicitário Marcos Valério e a Polícia Federal, que detalha um esquema conhecido como mensalão tucano, também atinge os senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e José Serra (PSDB-SP), além dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Segundo a Folha apurou, a colaboração com a PF incorpora 60 anexos (relatos de episódios de supostas irregularidades) que haviam sido rejeitados pela Procuradoria-Geral da República e pelo Ministério Público de Minas Gerais. O novo acordo ainda ampliaria a lista de implicados.
A delação, assinada neste mês, foi enviada ao STF (Supremo Tribunal Federal) e depende de homologação. Não está claro quais episódios serão considerados e investigados pela PF.
Valério escreveu a delação à mão na prisão e teve os anexos posteriormente digitados. Os relatos contêm erros de grafia, além de equívocos em nomes de personagens e datas.
Condenado a mais de 37 anos de prisão pelo mensalão, Valério também é réu acusado de operar desvios por meio de suas agências de publicidade, a SMP&B e a DNA Propaganda, para financiar a fracassada campanha de reeleição do então governador mineiro, Eduardo Azeredo (PSDB), em 1998.
Uma planilha assinada pelo publicitário aponta que a campanha recebeu cerca de R$ 10 milhões (R$ 33 milhões hoje) em desvios de estatais como a Cemig, Copasa, Furnas, Comig, Eletrobras, Petrobras, Correios, Banco do Brasil e Banco do Estado de Minas Gerais, que seria privatizado ainda em 1998.
O documento, com data de 1999, foi entregue à PF. O relatório aponta ainda que quase R$ 48 milhões (R$ 159 milhões atuais) foram obtidos via empréstimos, especialmente com o Banco Rural. As dívidas, segundo os anexos, seriam quitadas por construtoras, como a ARG e a Andrade Gutierrez.
De acordo com o controle de Valério, foram arrecadados e distribuídos ao menos R$ 104 milhões (R$ 346 milhões corrigidos) na campanha. A lista de recebedores inclui políticos e membros do Judiciário.
Segundo a narrativa do publicitário, o esquema de empréstimos fraudulentos do Banco Rural e ainda um repasse de R$ 1 milhão da Usiminas via caixa dois beneficiaram também as campanhas de FHC (1998), Aécio (2002) e Serra (2002). A siderúrgica também foi usada na eleição de Lula, em 2002, conta Valério.
Os anexos afirmam que Serra atuou, após perder a eleição presidencial de 2002, para resolver pendências do Banco Rural e, em troca, teve R$ 1 milhão de dívidas de campanha pagos pelo banco por meio da SMP&B.
PROPINA
Valério relata, nos anexos apresentados ao Ministério Público, pagamento de propina em troca da obtenção de contratos para suas agências. Durante o governo FHC, afirma, a DNA propaganda repassou a Aécio 2% do faturamento do seu contrato com o Banco do Brasil, que havia sido arranjado pelo senador com o aval do ex-presidente.
O publicitário conta que, no governo Lula, pagava R$ 50 mil por mês ao ex-ministro José Dirceu (PT) como acerto por uma conta de publicidade dos Correios. A troca de favores teria se repetido em órgãos como a Câmara dos Deputados, o ministério dos Esportes e a Assembleia de Minas, entre outros.
Valério afirmou ainda que Aécio encontrou-se, em Belo Horizonte, com a diretoria do Banco Rural e com os então deputados Eduardo Paes (PMDB-RJ) e Carlos Sampaio (PSDB-SP), da CPI dos Correios, de 2005, para blindar investigações sobre a campanha de Azeredo. A maquiagem de dados do banco pelo tucano foi delatada também pelo ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS).
Em outra CPI, a do Banestado, de 2003, o Banco Rural, segundo Valério, repassou R$ 500 mil a parlamentares por meio do deputado federal José Mentor (PT-SP) para escapar de acusações.
MENSALÃO
Os 60 anexos iniciais de Valério narram que o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, foi nomeado pelo ex-presidente para ser o contato com a SMP&B em meio à crise do mensalão, em 2005, e acertou um pagamento via Andrade Gutierrez.
"Ficou acertado uma ajuda no valor de R$ 5 milhões para pagar as despesas dos advogados [...]. Ele nos falou que a construtora Andrade Gutierrez faria o pagamento [...]. Pagamos os advogados dos réus, dando um pouco para cada um dos seis réus do núcleo político", relata.
Valério diz ainda que, junto com o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, articulou um encontro entre o banqueiro Daniel Dantas e o ex-ministro Antonio Palocci para resolver problemas do Grupo Opportunity com o governo Lula.
Em troca, a Brasil Telecom, controlada pelo grupo, contratou serviços superfaturados do publicitário Duda Mendonça no valor de R$ 12 milhões.
Os anexos relatam ainda uma série de episódios envolvendo propina, como o pagamento de uma reforma no estádio do Morumbi e em prefeituras mineiras.
TENTATIVAS
As tratativas para delação começaram ainda em meados no ano passado. Um ofício de junho do Ministério Público de MG pede que os relatos sejam enviados à PGR por tratarem de políticos com foro privilegiado no STF. A Procuradoria chegou a enviar representantes a Minas, mas não levou o acerto adiante.
Uma nova tentativa com a 17ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de BH foi recusada em março deste ano.
Sete réus do mensalão tucano, incluindo Válério, ainda aguardam julgamento. O episódio gerou, até agora, a condenação de Azeredo a 20 anos e dez meses de prisão por peculato e lavagem de dinheiro. O julgamento em segunda instância está marcado para o próximo dia 8.
OUTRO LADO
A defesa do ex-governador de Minas Eduardo Azeredo (PSDB-MG) afirma que não irá fazer comentários antes de ter acesso à delação.
Alberto Toron, advogado do senador Aécio Neves (PSDB-MG), diz que as acusações de Marcos Valério são falsas e que o publicitário "busca, reiterada e desesperadamente, benesses para amenizar sua pena".
"Muitas das acusações que agora faz contra o senador Aécio Neves, antigamente fazia contra o PT. Seu discurso se amolda e seus personagens se alteram, não de acordo com a verdade, mas de acordo com seus interesses privados e escusos", diz Toron.
O advogado argumenta que o contrato da DNA, de Valério, com o Banco do Brasil foi firmado em 1994, antes do governo Fernando Henrique Cardoso. "O próprio Ministério Público, em outras oportunidades, reconheceu e descartou as inverdades dos discursos proferidos pelo sr. Marcos Valério."
A assessoria do ex-presidente FHC afirma que ele desconhece a delação e qualquer pagamento de caixa dois em sua campanha à reeleição.
A assessoria do senador José Serra (PSDB-SP) afirmou que "todas as suas campanhas eleitorais foram conduzidas dentro da lei, com as finanças sob responsabilidade do partido". "Acusações dessa natureza envolvendo o senador são descabidas e completamente absurdas."
A assessoria do Instituto Lula afirma que, desde 2012, Valério faz acusações sem provas contra o PT e contra o ex-presidente Lula. Diz ainda que todas as investigações foram arquivadas pelo MP e que Paulo Okamotto não irá comentar suposições de delações.
O advogado de José Dirceu, Roberto Podval, diz que dar credibilidade a Valério é "desacreditar o próprio instituto da delação, que deve ser tratado com responsabilidade".
O deputado José Mentor (PT-SP) afirmou não ter conhecimento da delação e que "não tratou de qualquer assunto da CPI do Banestado com Valério".
A assessoria do Banco Opportunity afirma que Daniel Dantas não se encontrou com o então ministro Antonio Palocci. "Delúbio Soares pediu ao Opportunity que o ajudasse a pagar dívidas do PT, o que foi rejeitado."
Segundo a assessoria, a agência de Duda Mendonça foi responsável pelo lançamento da Brasil Telecom GSM, empresa de celular. O publicitário sugeriu o plano "Pula-Pula: o consumidor pagava num mês, não pagava no outro –o que era fácil de entender e foi sucesso."
A defesa de Duda Mendonça preferiu não se manifestar. A defesa de Delúbio afirma que não teve acesso à delação, mas reafirmou que o ex-tesoureiro do PT nunca cometeu qualquer ato ilegal e está à disposição para esclarecimentos.
A assessoria da Andrade Gutierrez afirma que a empresa, que firmou acordo de leniência, não vai comentar a delação, mas "reforça seu compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado".
A Folha não obteve sucesso no contato com o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (PMDB), com o deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP) e com o ex-ministro Antonio Palocci nesta sexta (21).
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