ÉPOCA – Qual é sua maior motivação hoje: reduzir a má judicialização da saúde ou atuar como o relator da Lava Jato na segunda instância?
Gebran Neto – Tenho duas atividades: minha jurisdição criminal em Porto Alegre e a atividade voltada à saúde, que atualmente é lateral. Em ambas, eu me sinto motivado em ser justo. Minha preocupação é ser correto, fazer o melhor e ser justo. Sou apaixonado pelo que faço. Tenho paixão pelo que faço na minha jurisdição, sempre tive, e tenho paixão pelo direito à saúde.
ÉPOCA – Em relação à Lava Jato, o senhor tem a responsabilidade de decidir o futuro político do ex-presidente Lula...
Gebran Neto – Eu disse que não ia tratar desse assunto.
ÉPOCA – Não posso deixar de perguntar. O senhor vai decidir uma questão de grande importância para o Brasil...
Gebran Neto – Não trabalho com essa lógica.
ÉPOCA – Qual é a lógica do senhor?
Gebran Neto – Minha lógica é que tenho a minha frente processos de diversas ordens e tenho de fazer meu melhor. Tenho de ser justo, equânime e imparcial. Tenho de ser correto. Vou fazer meu melhor e aplicar o Direito dentro das limitações da minha capacidade. Faço isso no processo em que julgo um traficante, em um processo de pessoa acusada de descaminho, em um estelionato contra a Previdência e também nos processos que envolvem corrupção, lavagem de dinheiro e crimes de grande monta. Vou analisar o processo, vou discutir o processo. Tenho uma equipe maravilhosa de servidores que trabalham comigo, debato profundamente com eles. Tenho certeza de que não sou o senhor da razão. Não acho que estou sempre certo. Debato e escuto as pessoas. Decidimos em três. Tenho outros dois colegas extremamente qualificados [os desembargadores Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus]. Convergimos em muitas coisas, divergimos em outras, mas essa é uma decisão plural. A minha decisão pode ser singular, embora bem debatida e refletida, mas a do tribunal é plural. Tenho certeza de que o tribunal tem atuado no melhor de suas forças para produzir uma boa jurisdição. Isso é fundamental. É entregar para a sociedade brasileira aquilo que aquele colegiado reconhece como justo, legítimo e legal. Essa é minha motivação. As decisões têm consequências políticas? Todas elas têm. A decisão sobre conceder ou não um medicamento também tem uma consequência política. O julgador não se preocupa com isso. Muitas vezes, ele tem de agir contramajoritariamente. Mas tem de fazer aquilo que acredita. Todos nós lá no tribunal fazemos isso.
ÉPOCA – O Artigo 196 da Constituição afirma que “saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas...”. Por que muitos juízes valorizam o que leem antes da vírgula e desconsideram o que aparece depois?
João Pedro Gebran Neto – Você destaca um ponto fundamental. Todo mundo diz que saúde é direito de todos e dever do Estado, mas a redação da Constituição não é só essa. Ela diz que isso deve ocorrer mediante políticas públicas. A meu juízo, esse é o cerne da discussão. Temos de discutir a política pública, e não um direito absoluto a todo tipo de providência. Temos direito a ter uma política pública que cubra o melhor tipo de assistência possível. Possível significa que temos um Estado e ele tem recursos econômicos limitados que devem ser geridos para dar conta de uma certa política.
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