A inusitada aposta da Petrobras na Bacia de Campos
A petroleira chegou a fazer uma oferta em valor 18 vezes superior à segunda melhor proposta, na 14ª rodada de licitação da ANP
Até o momento em que foram feitas as maciças ofertas da Petrobras, o leilão seguia rumo a um fiasco na manhã desta quarta-feira (27), no Rio de Janeiro. Antes de serem ofertadas as áreas em Campos, foram oferecidas oportunidades em outras oito bacias sedimentares, em terra e no mar, com um total de 279 blocos. Apenas 29 áreas receberam oferta. A Petrobras havia arrematado apenas uma, em terra, na Bacia do Paraná, por modestos R$ 1,7 milhão. No total, até aquele momento, a ANP, ou seja, a União, havia arrecadado menos de R$ 200 milhões, muito longe da expectativa de arrecadação de R$ 1 bilhão que o governo federal havia alardeado.
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Quando iniciou-se a oferta das oito áreas da Bacia de Campos, o jogo tomou outro rumo. Maior petroleira do mundo, a Exxon, empresa até então com discreta presença no mercado de exploração e produção no Brasil, decidiu levar dois blocos sozinha, desembolsando R$ 47 milhões e R$ 16 milhões, respectivamente. Nas três ofertas seguintes, Petrobras e Exxon se uniram em consórcio para arrematá-las por R$ 85 milhões. Até aí, nada demais. Nas duas áreas seguintes, a dupla de petroleiras resolveu mudar o patamar das apostas.
Em uma delas, a CM 346, a oferta chegou a R$ 2,24 bilhões, abatendo a proposta da Shell e Repsol (R$ 443 milhões), a chinesa CNOOC (R$ 127 milhões) e a dupla franco-britânica Total-BP (com modestíssimos R$ 25 milhões). Em outra, a CM 411, Petrobras e Exxon apostaram R$ 1,2 bilhão, contra lances muito menores de Total-BP (R$ 48 milhões), Shell (R$ 66 milhões) e CNOOC (R$ 31 milhões). Para terminar, a dupla arrematou mais uma área, por R$ 61 milhões, desta vez sem concorrência.
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Diante do disparate em relação às segundas ofertas, pairou a dúvida: erro de avaliação por parte da Petrobras ou profundo conhecimento do potencial de produção das áreas arrematadas? Pedro Parente, presidente da Petrobras, jura não ter havido falha. “A Petrobras detém o maior conjunto de informações sobre o offshore brasileiro. Portanto, não pagaríamos o valor que pagamos se não tivéssemos informações sobre o real valor”. Para uma fonte que acompanhou o leilão de perto, a estatal apostou alto porque assustou-se com a forte concorrência nas áreas.
De fato, em um leilão chocho em competição – em apenas 8 dos 37 blocos arrematados houve mais de uma oferta -- as duas áreas bilionárias foram as que mais tiveram concorrentes. A Petrobras só não conseguiu pressentir a pouca disposição desses concorrentes para o jogo. Preparou-se demais para quem parecia estar somente em treino – ou, considerando a declaração de Parente – quem não sabia exatamente o que jogava. Décio Oddone, diretor geral da ANP, explicou, em entrevista coletiva, que o fato de as áreas arrematadas estarem “na franja do pré-sal” dá indícios do potencial que têm.
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A oferta pesada da Petrobras traz à lembrança a folclórica participação da empresa de Eike Batista no leilão de áreas realizado na 9ª Rodada, em 2007, quando a sua então OGX gastou R$ 1,5 bilhão, de um total de R$ 2,1 bilhões arrecadados pela ANP. Arrematou, na ocasião, 21 áreas, pagando ágio altíssimo. Em uma das áreas, ofereceu R$ 300 milhões em um bloco onde nem sequer houve disputa. Muitas áreas ofertadas na ocasião haviam sido rejeitadas anteriormente pela Petrobras. Eike alegava que, para obter sucesso, usaria os conhecimentos de sua equipe técnica, a maioria egressa da Petrobras, e novas tecnologias para extrair óleo onde a estatal nada tinha encontrado. A história mostrou, sete anos depois, que Eike estava errado.
O caso da Petrobras parece longe do que aconteceu com Eike. Mas não deixa de causar estranheza que a estatal, que carrega uma dívida de R$ 295 bilhões (já foi de quase R$ 500 bi, em 2015), tenha topado desembolsar quase R$ 1,7 bilhão por duas áreas na Bacia de Campos que poderiam ter sido arrematadas, com folga, tendo gastado 70% menos, junto com seu sócio. Se a aposta alta foi certeira, só se saberá daqui a, pelo menos, oito anos – tempo médio para um reservatório entrar em franca produção.
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No resultado geral, porém, a empresa que mais apostou foi a Exxon. A gigante americana desembolsou mais de R$ 1,9 bilhão, ante R$ 1,8 bilhão da Petrobras, para garantir presença nos oito blocos oferecidos na Bacia de Campos e dois na Bacia de Sergipe/Alagoas, no mar.
Oddone, da ANP, diz que o resultado do leilão era esperado. A ANP comemorou o fato de o leilão ter batido recorde em arrecadação – R$ 3,8 bilhões. Segundo o executivo, a agência não esperava oferta em vários blocos. Muitas delas deverão entrar em uma espécie de cardápio permanente de áreas, que os investidores poderão arrematar para explorar sob concessão a qualquer momento, independentemente do leilão.
“Foi um bom leilão, com apostas surpreendentemente altas em alguns ativos. Houve baixa competição, mas houve empresas de peso, como a Repsol e a chinesa CNOOC, que vão trazer um nível bom de investimento para o país”, diz Giovani Loss, sócio da área de Óleo e Gás do escritório Mattos Filho. Em sua opinião, muitas empresas de grande porte podem estar guardando munição para as duas rodadas de áreas do pré-sal na Bacia de Santos, que vão acontecer em outubro.
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