Deveríamos ter forçado um pedido de desculpas dos militares, diz Genoino
Tendo exercido um papel considerado estratégico na interlocução entre o PT e as Forças Armadas durante os governos Lula e Dilma (2003-2016), o ex-deputado federal José Genoino (PT-SP) hoje considera que os governos do partido erraram ao não exigir um pedido de desculpas público dos militares sobre os crimes cometidos pelos agentes do Estado na ditadura (1964-1985). O ex-parlamentar diz continuar acreditando, contudo, que o melhor para o país foi não ter revisado a Lei da Anistia.
Nesta quarta-feira (28), a lei completa 40 anos. Promulgada em 1979 pelo último presidente da ditadura, João Figueiredo (1918-1999), após grande mobilização da sociedade civil e de líderes da oposição, a lei concedeu anistia “a todos quantos […] cometeram crimes políticos ou conexos com estes” de 1961 a 1979. Com isso, abriu espaço para o regresso de diversos políticos da oposição que estavam exilados no exterior. Desde o primeiro momento, contudo, a impunidade de militares que participaram da repressão à esquerda passou a ser questionada por familiares de mortos e desaparecidos.
Eles queriam que a lei fosse revisada para permitir a punção dos militares que sequestraram, torturaram e mataram. Em um vídeo de 2014, como relevado pela Folha, o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim contou como atuou para impedir a revisão da lei. Em seu depoimento, citou o papel de Genoino, que teria trabalhado “brutalmente no sentido de apaziguar os entendimentos”. Procurado pela Folha para comentar o depoimento, Genoino confirmou a percepção de Jobim e o elogiou como alguém “que sempre foi muito claro e coerente com as posições dele”.
Primeiro ex-guerrilheiro da esquerda a ser condecorado com a Medalha da Vitória, instituída em 2004 pelo Ministério da Defesa (a honraria a Genoino depois foi revogada, em 2017, no governo de Michel Temer), Genoino foi assessor especial no Ministério da Defesa na gestão de Jobim. Ex-presidente nacional do PT, Genoino foi condenado em 2012 no processo do mensalão a 4 anos e 8 meses de reclusão. Cumprida em regime semiaberto e domiciliar, a pena foi extinta em 2015 pelo STF.
Hoje, o ex-deputado acha que os governos do PT deveriam ter agido diferente em pelo menos dois pontos na relação com os militares. “Eu hoje faria uma revisão [do que foi feito]. Eu acho que a gente deveria ter forçado o pedido de desculpas e os militares deveriam ter admitido, para todo o país, os crimes e o terrorismo de Estado do período. O segundo ponto é que a Comissão Nacional da Verdade deveria ter sido instalada em 2003, logo no começo do governo Lula, e não depois”, disse o deputado.
A CNV só foi instalada em 2012, no primeiro mandato de Dilma Rousseff. Genoino disse que sempre defendia o pedido de desculpas quando tratava do assunto com civis e militares, mas sua posição acabou vencida.
“Falei no Ministério da Defesa, inclusive aos comandantes, que eles admitissem que houve crimes e terrorismo de Estado. Eu levei isso em vários lugares. Levei em palestras na ESG [Escola Superior de Guerra], no CMA [Comando Militar da Amazônia], quando era assessor de Jobim. E o Jobim sabia que eu defendia isso. Alguns militares achavam razoável, outros diziam ‘não dá’, outros, ‘a gente engole’. Foi uma situação tensa, mas eu coloquei essa questão para eles”, disse o ex-deputado.
Ele diz acreditar que esse pedido de desculpas era importante por ser “um ato de pacificação, de reconhecimento, isso é necessário”. “A questão nunca foi democraticamente solucionada. O nosso governo deveria ter solucionado.”
Folha de S.Paulo
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