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O general que pode implodir Trump. Patriota ou traidor?

A guerra continua: investigações sobre Mike Flynn, o principal nome em matéria de segurança nacional do novo governo, indicam suspeitas de teor explosivo

Pobres roteiristas da imensa categoria de filmes e séries envolvendo tramas sinistras no topo do poder nos Estados Unidos. A realidade da era Trump deixa a ficção a uma distância tão grande que dá pena dos criadores de complôs imaginários.
Basta ver a lista dos serviços de inteligência que estão investigando o general reformado Michael Flynn, o assessor de Segurança Nacional do novo governo, posto em que precisa orientar o presidente em relação a ameaças ao país representadas por organizações terroristas, países desconstruídos e governos inimigos.
FBI, CIA, Agência de Segurança Nacional e Departamento do Tesouro, todos estão escavando os contatos de Flynn justamente com o maior desses adversários, a Rússia.
Escavando e vazando: as notícias sobre as investigações de teor radiativo foram passadas de forma a sair menos de 48 horas depois da posse de Donald Trump.
Da mesma forma que aconteceu com o dossiê com detalhes escabrosos sobre o novo presidente, o vazamento só pode significar que há suspeitas (talvez até certezas) gravíssimas sobre Flynn. Ou uma trama dos principais órgãos de inteligência do país para derrubar Trump. Ou, naturalmente, ambas as hipóteses.
O cerne do que vazou até agora: Flynn falou por telefone cinco vezes com o embaixador russo em Washington, Sergei Kislyak, exatamente no dia em que o ex-presidente Barack Obama decretou uma série de represálias por intervenções da inteligência russa, como a divulgação de e-mails da cúpula da campanha de Hillary Clinton.
Os telefonemas foram confirmados e defendidos com argumentos relativamente consideráveis: Trump já estava eleito, Flynn indicado para um cargo que não depende de aprovação do Senado e os contatos tinham por objetivo acertar a primeira comunicação entre ele e Vladimir Putin.
Existe, evidentemente, a possibilidade oposta: Flynn intermediou algum tipo de negociação não só subreptícia como passível de ser enquadrada numa lei de 1799 que proíbe cidadãos americanos de negociar com governos estrangeiros envolvidos em disputas com os Estados Unidos. Praticamente traição.
É quase impossível que Flynn não soubesse do monitoramento. Ele fez carreira no serviço de informações do Exército e chegou a diretor da Agência de Segurança Nacional. É a mesma que o investigou (ou continua investigando), um órgão criado depois dos atentados de 11 de Setembro como um braço de Pentágono e do formidável organismo que envolve atividades domésticas, externas e de vigilância eletrônica.
Flynn foi demitido por Obama e passou a espalhar suas divergências com o governo, especialmente em relação às atividades da Al Qaida e a política em relação à Síria. Disse que existia pressão para subestimar o terrorismo islâmico e desincentivar uma intervenção que evitasse que a guerra civil na Síria gerasse pragas como o Estado Islâmico.
Flynn, evidentemente, estava certo. Mas sua visão política foi se aproximando do mundo das sombras das teorias conspiracionistas. Paralelamente, como fazem todos os seus colegas reformados, ele passou a ganhar dinheiro depois de sair da ativa. O nome da atividade é consultoria, mas podem chamar de lobby.
Um de seus clientes era uma empresa ligada ao governo de Recep Erdogan, o mesmo presidente turco que Flynn havia denunciado como protetor do Estado Islâmico na fase inicial (nisso, também estava certo).
Em 2015, o general de três estrelas, de família irlandesa, católica e democrata, apareceu num lugar estranho. Em torno de uma mesa redonda, era um dos convidados do banquete em homenagem aos dez anos da RT, fundada como Russia Today, a televisão que faz propaganda do governo russo. Dividiu os brindes com Vladimir Putin.
Na mesma mesa estava Jill Stein, a médica que é uma espécie de versão feminina do senador Bernie Sanders, o simpatizante comunista que concorreu com Hillary pelo Partido Democrata. Candidata a presidente pelo Partido Verde, Jill Stein teve 1,2 milhão de votos e muitos democratas acham que ajudou a eleger Trump ao “roubar” eleitores que fizeram a diferença em alguns estados.
Flynn já disse em entrevistas como destrinchou a natureza intrínseca do terror de inspiração muçulmana ao interrogar líderes presos do Afeganistão e no Iraque. Numa dessas ocasiões, forças americanas haviam flagrado 22 integrantes da cúpula da organização chefiada por Abu Musab Zarqawi.
Dela, originou-se o Estado Islâmico. Eram homens inteligentes, muitos com formação superior, que haviam desenvolvido uma rede organizacional e logística sofisticada, inteiramente dedicados a matar, mais do que os americanos, seus compatriotas iraquianos da corrente xiita. “Concluí que o ‘cerne da Al Qaeda’ não é composto de seres humanos, mas sim de uma ideologia com uma versão específica do Islã como centro”. A tática da “decapitação” – a morte de Osama Bin Laden e do próprio Zarqawi – não funcionaria contra esse sistema ideológico poderosamente ancorado em religião.
Seria em nome da guerra a esse inimigo poderoso que Flynn apoiaria, como Donald Trump, uma aliança com a Rússia de Trump? Sua dedicação a uma causa que considera existencial poderia apagar a fronteira entre um patriota que arriscou a própria carreira e um conspirador que trama com o inimigo? Como os roteiristas da série Homeland estão se sentindo?

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