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Moro: “Nem tudo está perdido”. A fala é, sim, infeliz!

Eis que, com a morte, o ministro passou a ser visto como uma espécie de guardador de arcanos, de segredos, que ninguém mais domina

O arquivo do que escrevi ao longo desses mais de 10 anos de blog está à disposição. Se e quando mudo de ideia ou avaliação ao revisitar alguns temas, aviso. Se não, então é… porque não. Concordei com o ministro Teori Zavascki muitas vezes. Discordei outras tantas, muito especialmente de seus votos no julgamento do mensalão. Ele compôs a maioria de seis ministros que, ao arrepio da lei, declararam a sobrevivência dos embargos infringentes. Lembram-se? Havendo quatro votos divergentes contra uma condenação, o réu tem direito a ter seu caso votado de novo.
Por que faço essa lembrança? Porque a deificação em curso de Teori Zavascki nada tem a ver com o apreço pelo morto. Parece-me mais esperteza não virtuosa de alguns vivos. Eu explico. Eis que, com a morte, o ministro passou a ser visto como uma espécie de guardador de arcanos, de segredos, que ninguém mais domina. É como se só ele tivesse a chave. Assim, qualquer que seja a solução, com a sua morte, sempre estaremos diante de uma resposta precária ou suspeita. E nunca faltará quem diga, quando contrariado: “Ah, Teori teria feito diferente”.
As falas chegam a assumir contornos dramáticos, e me parece evidente que a pressão busca tirar do futuro relator do petrolão a autonomia de que deve dispor um juiz para tomar decisões. Há um surdo alarido a pressionar o nome a ser escolhido para relatar o caso: “Faça o que queremos, ou diremos por aí que, com Teori, seria diferente”.
Até parece que o ministro não apanhou de dar gosto quando declarou sem valor as escutas telefônicas, executadas fora do prazo legal, que traziam o registro de conversas de Lula com Dilma. Até parece que o ministro não virou alvo da fúria de alguns que agora o idolatram quando censurou o juiz Sergio Moro por ter divulgado as conversas da então presidente. Até parece que o ministro não era acusado, em certos nichos, de ter atuado para evitar a prisão de Lula.
Mas eis que isso ficou pra trás, não é? Cumpre agora declarar a santidade de Teori, de canonizá-lo como “aquele que fazia tudo o que queríamos que fizesse”. Para que isso? Ora, se o novo relator contrariar esse ou aqueles anseios, então se vai gritar: “Lava Jato corre riscos…”.
Leio que, no velório de Teori, em conversa com um interlocutor, o juiz Sergio Moro teria dito: “Nem tudo está perdido…”. Nem tudo? Isso faz supor um dano irreparável para a investigação, mas sem perda total. Digam-me cá uma coisa: o que foi que se perdeu do ponto de vista institucional ou processual? Resposta: nada!
Os que agora se ocupam de anunciar o Teori sem máculas e único que seria capaz de manter a Lava Jato no caminho virtuoso querem é se apresentar como intérpretes do voto que o ministro daria.
Por mais que se preze o ministro que se foi, convém ter um pouco mais de respeito pelas instituições. Humano que era, Teori também cometia falhas e omissões em seus juízos. O mesmo acontecerá com o futuro relator do petrolão. E nem por isso se estará diante de uma conspiração.
O acaso segue sendo o maior criador de mitos da história.

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