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Jair Bolsonaro22 de julho de 2020 | 09:09

Sem registro na Anvisa, remédio mais caro do mundo teve alíquota zerada por Bolsonaro

BRASIL
O governo Jair Bolsonaro (sem partido) zerou a alíquota de importação do medicamento conhecido pelo nome comercial de Zolgensma. O presidente comemorou a decisão em suas redes sociais na segunda-feira (13).
Utilizado no tratamento de crianças com atrofia muscular espinhal (AME), o remédio é tido como o mais caro do mundo –atualmente, custa cerca de R$ 12 milhões (dose única, valor levantado pelo próprio governo federal).
No entanto, ele ainda não foi registrado na Anvisa, procedimento necessário para assegurar que o medicamento está de acordo com a legislação sanitária e para minimizar eventuais riscos à saúde.
Ex-diretores da Anvisa e ex-membros do Ministério da Saúde disseram à Folha que não se lembram de outra ocasião em que o Executivo tenha zerado a alíquota de importação de um medicamento que não tivesse passado antes pelo controle da Anvisa, o que é visto como a criação de um precedente negativo.
Em primeiro lugar, por ignorar uma etapa do controle de segurança dos medicamentos, esvaziando a competência técnica e facilitando a exposição a risco. Em dezembro de 2019, por exemplo, um parecer técnico do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) afirmou que ainda há “grande incerteza sobre os efeitos” do Zolgensma no tratamento de AME.
Em segundo lugar, por dar uma chancela do governo brasileiro a um medicamento de altíssimo custo, facilitando judicializações que podem ter impacto enorme no orçamento do Sistema Único de Saúde.
Ao zerar a alíquota, argumentam, o governo brasileiro deu seu reconhecimento de que se trata de uma terapia válida. Essa decisão fortalece o argumento dos interessados no medicamento ao ingressarem na Justiça e exigirem a compra pelo sistema público de saúde. Dado que uma única dose do remédio custa cerca de R$ 12 milhões, qualquer determinação judicial de compra do Zolgensma atualmente terá consequências orçamentárias significativas, ponderam.
“É muito importante seguir o arcabouço de pesquisa institucional que foi construído com tanto cuidado e também preservar o interesse coletivo, o bem comum. Mas existe essa tensão entre a necessidade individual e o bem comum”, afirma a professora Hillegonda Maria Novaes, da Faculdade de Medicina da USP.
Ele afirma que foi criado um precedente que é “péssimo”. “Até o momento, medicamentos que não foram registrados na Anvisa não têm sido fornecidos [na Justiça], só em casos excepcionais, tratados como anomalias que não devem acontecer”, completa.
Para Diovana Loriato, diretora nacional do Iname (Instituto Nacional de Atrofia Muscular Espinhal), a medida do governo ajuda, mas ainda é um primeiro passo.
“Além do custo da medicação, tinha o imposto da importação, de cerca de 4%, e tem também o ICMS, que gira em torno de 18% do valor da medicação. A medida é importante, passo positivo, mas a gente precisa que os governadores tenham a mesma sensibilidade do governo federal para que as famílias não tenham esse pesado custo”, argumenta.
Ela diz que mais de 20 famílias no Brasil têm feito campanhas nas redes sociais para conseguir arrecadar os valores necessários para importar o Zolgensma.
“É um primeiro passo de uma longa jornada, com alíquota zerada, ICMS zerado, incorporação no SUS e inclusão do medicamento no rol da OMS para que seja de fornecimento obrigatório pelos planos de saúde”, continua.
Sobre a decisão da zerar o imposto ter precedido o registro na Anvisa, Diovana não vê problemas de segurança.
“O registro possibilita que o medicamento possa passar a ser comercializado no Brasil. Estamos falando de um medicamento aprovado pelo FDA (Food and Drug Administration, agência de fármacos e alimentos dos EUA), pelo EMA (órgão europeu) e também no Japão. É uma medicação segura. A aprovação na Anvisa vai acontecer nos próximos dias. Não tem qualquer tipo de problema esse imposto ter sido zerado um pouco antes da aprovação, que vai sair e já aconteceu nas agências mais sérias do mundo”, diz.
O Zolgensma foi registrado pelo FDA em 2019, decisão que foi sucedida por denúncias e investigação por manipulação de dados. A agência chegou a falar em responsabilizar cível e criminalmente a Novartis, laboratório que desenvolve o medicamento. No entanto, o FDA afirmou em maio de 2020 que o medicamento é seguro para uso e não puniu a empresa.
Em nota, a Anvisa diz que o processo de registro do Zolgensma foi peticionado em 13 de janeiro de 2020. Após análise inicial, a agência pediu à Novartis alguns “dados necessários para comprovar a eficácia e segurança da medicação”. A empresa, então, enviou o que foi requisitado em 26 de junho e a Anvisa avalia a possibilidade de registro.
Sobre o processo no FDA, a Anvisa diz que acompanhou todo o processo e que “dados finais mostraram que a manipulação não impactou na qualidade, segurança e eficácia do produto”.
O Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Camex), órgão interministerial responsável pela resolução de zerar a alíquota de importação, diz que o Ministério da Saúde foi consultado e não apresentou objeções.
“Segundo informou o Ministério da Saúde, trata-se de terapia experimental e a importação é permitida, sob conta e risco dos interessados.”
Sobre a ausência de registro na Anvisa, disse que ele é sujeito a prazos e regulamentos próprios e “não tem correlação com o imposto de importação”.
“A partir do estudo sobre a classificação fiscal, confirmada a não produção e não havendo óbice do Ministério da Saúde, o governo brasileiro conferiu tratamento similar ao que é concedido aos demais produtos de saúde na mesma situação”, completou.
A decisão foi motivada, afirmam, pelo pleito oficial de uma família que tem uma criança que sofre de AME.
O Ministério da Saúde diz que o fim da alíquota não interfere nos valores pagos nas aquisições feitas pela pasta, “uma vez que é isenta”. “Logo, não haverá impacto em eventuais processos judiciais nos quais a União seja parte.”

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