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Brasil e Rússia não são províncias dos EUA, diz embaixador
Foto: Reprodução
O Brasil e a Rússia têm divergências sobre a crise venezuelana, mas devem conversar entre si e não se comportar como “províncias dos Estados Unidos”.

Esse é o recado levado nesta terça (25) pelo diretor do Departamento de América Latina do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Aleksandr Schetinin, para encontros no Itamaraty.

Schetinin é diplomata com longa experiência na região, tendo sido embaixador na Argentina e trabalhado junto à OEA (Organização dos Estados Americanos), instituição que vê “privatizada para alguns interesses” —no caso, americanos.

Ele conversou com a reportagem após uma palestra na Fundação Fernando Henrique Cardoso, na terça (23) em São Paulo. O foco de sua fala foi a polêmica acerca do apoio de Moscou à ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela, mas ele não se furtou a responder sobre outros temas espinhosos.

Um momento inusitado ocorreu quando a chefe do escritório do Itamaraty em São Paulo, embaixadora Débora Barenboim, disse que Brasil e Rússia discordavam de temas regionais e, por isso, caberia perguntar se “os Brics ainda faziam sentido”.

Schetinin rememorou os mais de dez anos de relação do grupo, um acrônimo inglês para Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. “Eu não acho que as diferenças devam ser motivo para deixar para trás o que se fez e o que se pode fazer. Um ditado francês fala que o melhor remédio para dor de cabeça é a guilhotina, mas eu acho que é melhor conversar”, respondeu.

Depois, no fim de sua fala, fez um apelo fora do escopo diplomático. “O Brasil está condenado a ser um grande país. Sua postura é referência. Não sejam um país regular”, afirmou. Ninguém falou em governo Jair Bolsonaro (PSL), claro, mas no ambiente tucano do evento, a mensagem pareceu clara.

A reportagem perguntou a ele se o alinhamento automático proposto pelo Brasil aos interesses dos Estados Unidos de Donald Trump não seria uma trava às negociações com a Rússia. “Acreditamos na cooperação porque os interesses são recíprocos”, afirmou.

“Além disso, acho que os países da América Latina, por serem mais antigos do que o sócio do norte, são mais sábios também”, disse, lembrando que o Brasil é responsável por um terço do comércio russo com a região.

Para o embaixador, o fato de os EUA considerarem a Rússia como uma “influência negativa na região”, nas palavras do chefe do Comando Sul de suas Forças Armadas, deveria ser rechaçado como interferência externa.

Sobre o apoio continuado à ditadura de Maduro, que ao contrário do Brasil Moscou considera o governo legítimo em Caracas, Schetinin afirma que não há motivo para mudança.

“Maduro cometeu erros, claro. Mas pior são sanções que levam a uma situação de caos. Aí, o desgosto popular fica evidente. Mas a solução precisa ser dada por venezuelanos, não estrangeiros”, afirmou.

Ele rechaça que Moscou tenha flexionado músculos militares ao enviar dois aviões com tropas e equipamentos para Caracas, há um mês, no auge das tensões fronteiriças. “Como se sabe, eram parte de um contrato em curso. São técnicos militares, não soldados”, afirmou. Mas não foi um sinal a Washington? “Tudo é um sinal só: a Venezuela tem um governo legítimo”.

Schetinin insistiu na palestra que os EUA violam o direito internacional na região. Não seria o mesmo na Crimeia, questionou o cônsul peruano Carlos Ortiz, sobre a península anexada por Vladimir Putin em 2014? “Tudo começa com um golpe que derrubou um presidente legítimo na Ucrânia”, afirmou Schetinin, repetindo depois o mantra russo de que os crimeus fizeram uma escolha soberana —apesar de a ONU não reconhecer o plebiscito pelo qual se uniram a Moscou há cinco anos.

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