Foto: Isac Nóbrega/PR
06 de setembro de 2020 | 07:01Por obras do Pró-Brasil, governo terá de tirar verba de ministérios
Para tentar bancar obras com dinheiro público neste ano, o governo federal decidiu fazer um pente-fino no orçamento de diferentes ministérios. O objetivo é estudar que recursos poderiam ser redirecionados para as pastas da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional.
Na busca de R$ 6,5 bilhões para os dois ministérios, a equipe econômica vai precisar remanejar o dinheiro atualmente reservado para outras áreas, mas que ainda não foi usado.
O secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, disse nesta sexta-feira (4) que serão usados recursos remanejados.
“A destinação para obras virá de outra fonte, muito provavelmente de cancelamento [de outras ações]. Isso está sendo tratado”, afirmou.
Segundo ele, eventuais sobras de créditos extraordinários (que ficam de fora do teto de gastos) em 2020 devem ir para atos ligados à Covid-19, até mesmo para justificar o uso do instrumento.
Técnicos da área de Orçamento fazem uma varredura nas programações de gastos para identificar quanto cada ministério poderia perder. A ideia é dividir o ônus entre vários setores, e até a verba da Presidência pode ser cortada.
O governo já espera uma forte reação pela Esplanada dos Ministérios. Um primeiro exemplo citado por membros do Executivo foi a comunicação de retirada de recursos do Ministério do Meio Ambiente.
O ministro da pasta, Ricardo Salles, anunciou que os cortes paralisariam as atividades do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) de combate a incêndios. Mas logo teve de voltar atrás diante da reação negativa, inclusive de colegas do governo.
De olho na projeção política, alguns ministros do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) defendem a ampliação do investimento público, como recursos para rodovias e combate à seca no Nordeste. O plano contrariou o ministro Paulo Guedes (Economia), que impediu um volume maior de recursos.
Mesmo assim, Guedes teve de ceder para a criação do programa Pró-Brasil, que agora foi repensado para conter também uma série de iniciativas, como mudanças regulatórias.
A varredura por dinheiro no Orçamento também não poupou o Ministério da Educação. Técnicos identificaram que parte da verba educacional não deverá ser usada por causa da redução das atividades durante a pandemia da Covid-19.
Os gastos com educação estão acima do piso instituído na Constituição, que atualmente está um pouco abaixo de R$ 55 bilhões. O objetivo do governo é remanejar recursos que, segundo técnicos, ficarão “empossados”, ou seja, que a máquina pública não conseguirá usar até o fim do ano.
O Ministério da Cidadania, que cuida de programas sociais, e o orçamento da Cultura também estão na mira.
O ministro Onyx Lorenzoni (Cidadania) recebeu verba extra nesse ano por causa da crise do coronavírus e, por isso, segundo integrantes do Ministério da Economia, seria possível destinar uma parcela para obras.
No caso do Ministério da Saúde, há também a possibilidade de retirada de recursos já que o piso constitucional da área (cerca de R$ 121 bilhões) será superado diante da pandemia.
Os técnicos, porém, ainda vão decidir como será feita a distribuição do corte para conseguir os R$ 6,5 bilhões do plano de infraestrutura, prometidos à ala do governo favorável a obras e ao Congresso.
As trocas no Orçamento terão de ser aprovadas em um projeto de lei a ser encaminhado ao Congresso. Portanto, a ideia é encontrar verbas pouco sensíveis politicamente (que estavam programadas para gastos de baixo impacto social).
Bolsonaro tem se beneficiado politicamente do pagamento do auxílio emergencial e de conclusão de obras, principalmente na região Nordeste, onde a popularidade dele foi mais baixa nas eleições.
Liderado pelo ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), parte do governo tentou usar brechas no Orçamento, por causa da pandemia, para conseguir mais dinheiro para obras.
O teto de gastos —regra que limita o crescimento das despesas públicas— foi o principal alvo. Mas Guedes, com apoio do TCU (Tribunal de Contas da União) e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), conseguiu conter as pressões.
A ala pró-obras queria usar o argumento de que projetos de combate à seca e de habitação popular, por exemplo, eram urgentes e necessários para o enfrentamento da Covid. Assim, o dinheiro ficaria livre da limitação do teto —como foi feito para o auxílio emergencial, programado para acabar neste ano.
Contrária a essa tese, pois as obras seriam encerradas após o período de calamidade pública (31 de dezembro de 2020), a equipe econômica se mobilizou para derrubar a articulação encabeçada por Marinho.
O resultado foi um plano de obras mais enxuto e que não burla o teto de gastos. Uma derrota para o ministro do Desenvolvimento Regional, que também tentou articular no Congresso propostas para aumentar os recursos em suas mãos.
Inicialmente, seriam destinados R$ 5 bilhões para o Pró-Brasil por meio desse projeto de lei com mudanças no Orçamento. Mas Bolsonaro cedeu à pressão de ministros e do Congresso e o valor subiu para R$ 6,5 bilhões.
O dinheiro será repartido entre projetos selecionados por Marinho, por Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura) e também por congressistas.
A equipe de Guedes afirmava que, se o Pró-Brasil furasse o teto de gastos, seria uma sinalização ruim para investidores sobre o controle das despesas públicas e, por isso, uma tímida ampliação nas obras públicas poderia afastar o capital privado do Brasil, aposta do ministro para a retomada da economia.
Folha de S. Paulo
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