Melhor do que novela: as viradas da investigação sobre Trump
Tecnicamente, presidente nem está sob o crivo do promotor especial, mas o inquérito a cargo de ex-diretor do FBI virou um espetáculo para nervos fortes
Talvez por isso Trump nem tenha escrito o nome dele no Twitter. Só as notícias sobre a atuação suspeita de Strzok, que era vice-diretor de contrainteligência do FBI e acabou encostado no setor de Recursos Humanos.
O afastamento aconteceu em agosto, mas só agora apareceu o motivo: as mensagens de texto que trocou durante a campanha presidencial com a advogada Lisa Page, com quem estava tendo um caso, com críticas a Trump e manifestações de apoio a Hillary Clinton.
Complicação adicional: Strzok também foi o representante do FBI que entrevistou Hillary no caso do servidor particular usado para trocar emails quando era secretária de Estado.
Sexo, política e mensagens presumivelmente apimentadas, em vários sentidos, formam uma complicação explosiva que queimou as asas de Strzok e agora entra no emaranhado de investigações e contra-investigações do Departamento de Justiça, de comissões do Congresso e da imprensa.
Desde quando mensagens pessoais podem ser usados para avaliar conduta profissional? Desde que alguém trabalhe no FBI, esteja no alvo de uma inspeção determinada já no governo Trump e atue sob o comando de Robert Mueller.
Ex-diretor da polícia federal, Mueller foi encarregado pelo Departamento de Justiça de investigar se houve algum conluio de Trump, ou de pessoas sob suas ordens, com elementos do governo russo para prejudicar Hillary.
Strzok estava “emprestado” a ele. Conforme sua atuação seja vasculhada, pode teoricamente tornar imprestáveis alguns elementos da investigação.
Mueller nem teve tempo de aproveitar seu maior troféu até agora: levar o general da reserva Michael Flynn, ex-conselheiro de Segurança Nacional, à humilhação de uma audiência perante um juiz em que reconheceu ter mentido ao FBI sobre contatos com o embaixador russo depois da eleição presidencial.
A delação premiada de Flynn levaria a Jared Kushner, o genro do presidente, e até ao próprio Trump. Esta uma notícia exclusiva de Brian Ross, veterano jornalista da rede de televisão ABC. Inverídica, como foi rapidamente reconhecido.
Ross foi suspenso por um mês e Trump sugeriu, com a sutileza habitual, que os prejudicados com a queda no mercado de ações provocada por seu “furo” desmentido – 350 pontos no Dow Jones – processem a ABC.
A vida está dura para muita gente, inclusive para quem tenta deslindar a teia de investigações e interesses relacionados ao caso.
O afastamento de Strzok já era considerado suspeito, tanto que a comissão de Inteligência da Câmara, presidida pelo deputado republicano Devin Nunes, havia pedido explicações ao FBI. Agora, Nunes está furioso: o motivo foi vazado para a imprensa antes de chegar à comissão.
Segundo a narrativa preferida pelos trumpistas, o FBI facilitou as coisas para membros do governo Obama e para Hillary, em especial quando o vice-diretor Andrew McCabe conduziu as investigações sobre a ex-secretária de Estado.
A mulher de McCabe tentou uma candidatura ao Senado pelo Partido Democrata e recebeu doações de um governador ligado aos Clinton. Mulheres de altos quadros do FBI devem não apenas não ter conflitos de interesses como evitar a aparência deles.
A advogada Lisa Page, a que trocava com o amante as mensagens de texto favoráveis à candidata democrata, trabalhou com McCabe no caso Hillary.
O vice-diretor de nome complicado, que tinha um caso com ela, pode estar envolvido no dossiê sobre Trump encomendado pelos democratas a um ex-agente secreto britânico. Aquele envolvendo russos na escuta e russas num hotel em Moscou.
Já pela narrativa dos antitrumpistas, vai tudo acabar em impeachment. E talvez nem seja necessário um longo processo: só os tuítes de Trump fazendo comentários sem noção sobre um processo criminal o levarão à autodestruição.
Pelo menos era esta a impressão antes da próxima guinada. E do próximo tuíte.
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