Estadão
Plenário da Câmara dos Deputados
Bolsonaro avalia mandar reforma administrativa com veto à filiação partidária
BRASIL
A reforma administrativa em fase de análise final por Jair Bolsonaro inclui o veto à filiação partidária de uma parcela de futuros servidores. O presidente, que se debruçará sobre a iniciativa nesta terça-feira (18), prometeu apresentá-la ao Poder Legislativo nesta semana.
A proposta passou por avaliação de diferentes ministérios. Consolidada há duas semanas em reunião no Palácio do Planalto, ela deve alterar a estrutura do funcionalismo e o plano de cargos e salários.
Se a proposta de proibir a adesão a partidos não for retirada de última hora por Bolsonaro, que ainda avalia o projeto, a medida vai enfrentar forte resistência no Parlamento.
Integrantes da equipe do Ministério da Economia, da Casa Civil, além dos ministros Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União), Jorge Oliveira (Secretária-Geral) e André Mendonça (Advocacia-Geral da União) ficaram reunidos no dia (6) e quase vararam a madrugada na discussão do texto.
Bolsonaro pediu a eles que só saíssem do Planalto após a finalização do parecer sobre a proposta.
A ideia era passar um pente-fino para retirar trechos controversos. Dessa forma, a equipe chegaria a um projeto de consenso sobre a primeira etapa da reforma, que é o envio da PEC (proposta de emenda à Constituição).
Um dos itens polêmicos, porém, ficou no texto.
Incluída inicialmente pela equipe econômica, a previsão de veto à filiação partidária a futuros servidores públicos de carreiras exclusivas de Estado foi avalizada pelos demais ministros. Essas carreiras serão definidas posteriormente em projeto de lei.
Após o encontro, a proposta foi detalhada a Bolsonaro, em uma apresentação de PowerPoint.
O presidente ouviu as medidas. Ele ainda reiterou o que já havia dito antes a seus auxiliares, de que quer que o funcionalismo continue sendo atraente.
Depois disso, o texto passou por um novo pente-fino e será enviado novamente ao presidente nesta terça para uma decisão final.
“Estamos na iminência de mandar a reforma administrativa, não vai atingir os já servidores, não vai ser mexido nada no tocante a eles”, afirmou Bolsonaro nesta segunda-feira (17).
O presidente se disse otimista. “Eu espero que sim [que nesta semana saia e seja enviada ao Congresso]. Espero que essa semana nasça essa criança aí, que está demorando muito para nascer, tá parecendo filhote de elefante, não é dois anos gestação de elefante?”
Líderes no Congresso e uma ala de aliados de Bolsonaro no próprio Planalto defendem a retirada do veto à filiação partidária para evitar tumulto entre os parlamentares. Porém, até a sexta-feira (14), o presidente não havia mudado o texto.
No ano passado, o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), que é servidor púbico concursado da Câmara também, chegou a conversar com a equipe econômica sobre a medida.
No Legislativo, a Frente Parlamentar Mista do Serviço Público tem 255 integrantes, dos quais 21 senadores.
Dados do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) mostram que a Câmara tem ao menos 67 servidores públicos eleitos.
Deles, 35 são da área de segurança pública e provavelmente serão enquadrados no grupo das carreiras de estado.
Se estivesse em vigor no passado, eles teriam de ter sido exonerados para se filiar a partidos ou se candidatar. Para líderes de partidos aliados ao Bolsonaro e de siglas de oposição, a vedação à filiação partidária é uma afronta aos direitos políticos dos servidores.
“É um absurdo completo. A Constituição garante os direitos políticos a todos. Se assim fosse, Bolsonaro e eu não seríamos eleitos”, diz o senador Major Olimpio (PSL-SP).
Na Câmara, segundo o deputado Capitão Augusto (PL-SP), há 21 militares, dos quais 15 são policiais.
Hoje eles não podem ter filiação partidária enquanto em exercício, mas têm o direito de se filiar no dia da convenção caso queiram ser candidatos e, neste caso, entram em uma licença.
Se não forem eleitos, podem retornar à atividade. Se forem, são aposentados compulsoriamente.
Já policiais federais não têm nenhum impeditivo de serem filiados, assim como as carreiras da AGU (Advocacia-Geral da União) também não.
O deputado Capitão Augusto trabalha em uma PEC que vai no sentido contrário ao texto do governo justamente para prever que os policiais possam se licenciar enquanto estiverem cumprindo o mandato.
“Não acredito que o governo vá mandar um texto com essa previsão. Não vai passar aqui. Se for assim, é um cerceamento do direito político”, afirmou.
O filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (RJ), que é escrivão da Polícia Federal, licenciado do cargo para exercer o mandato de deputado, teria sido atingido pela norma se ela valesse no passado.
O deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), que vai presidir a frente da reforma administrativa, que está sendo criada, diz que ao fazer a proibição, o governo ainda assim não consegue evitar problemas de atuação enviezada.
“O problema não está na filiação, mas na atuação do servidor com interesses políticos partidários, que é algo que pode acontecer inclusive se o servidor não for filiado.”
Congressistas aliados a Bolsonaro também não são categóricos ao defender o texto.
Bia Kicis (PSL-DF) diz que precisa estudar o assunto antes de se posicionar.
O texto da PEC não prevê licença ou aposentadoria em caso de filiação, sinalizando que o destino de quem quiser se agregar a um partido é a exoneração.
Ela apenas descreve a vedação a servidores exclusivos de Estado, mas não entra em detalhes. No ano passado, o ministro Paulo Guedes (Economia) chegou a dizer que os servidores não podem ser militantes.
Apesar de Bolsonaro ter dito na quinta-feira (13) que enviará a reforma nesta semana ao Congresso, aliados estão céticos.
A reforma que será enviada vai dividir o funcionalismo em ao menos três tipos de servidores: os de carreira, os únicos que terão estabilidade após passarem por estágio probatório, os de contrato indeterminado e os provisórios.
A perspectiva é a de que haja uma corrida das categorias em busca da garantia da estabilidade. Na Economia, há quem defenda que um número mínimo de categorias se enquadrem nesse modelo.
Bolsonaro, porém, já adiantou que defenderá que algumas classes sejam consideradas de Estado. Entre elas estão Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Forças Armadas e Receita.
Enquanto isso, o Congresso se arma para debater a proposta. A coordenadora da Frente Parlamentar do Serviço Público, Alice Portugal (PC do B- BA), diz que proibir a filiação partidária é inconstitucional.
“O servidor público tem o direito de votar e ser votado. Julgamos a previsão absolutamente extemporânea e que interfere na democracia”, diz.
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